TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

636 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 12. Concluindo, nesta parte, diremos que, não sendo a interpretação normativa do artigo 17.º-G, n.º 4, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas desaplicada nos autos, inconstitucional per se, e não se veri- ficando que qualquer das suas aplicações necessárias se revele violadora da Constituição (uma vez que a aplicação feita na douta decisão recorrida não resulta de uma inexorável imposição legal), a interpretação normativa questio- nada nos presentes autos não se revela desconforme com a Constituição da República Portuguesa, nomeadamente com o disposto nos n. os 1 e 4, do seu artigo 20.º. 13. Complementando e robustecendo esta conclusão com a análise substantiva da compatibilidade constitu- cional da interpretação normativa sob escrutínio e, bem assim, das suas concretas aplicações, diremos ainda, que a interpretação normativa que a Mm.ª Juíza a quo extraiu do mencionado artigo 17.º-G, n.º 4, do Código da Insol- vência e da Recuperação de Empresas – designadamente na parte em que manda aplicar o disposto no artigo 28.º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas – ao salvaguardar que tal aplicação deve ser feita com as necessárias adaptações, impõe ao decisor (por força do ditame constitucional contido emergente do artigo 20.º, n. os 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa) que garanta ao devedor que não se conforme com o parecer do administrador judicial provisório, e que se oponha à imediata declaração da situação de insolvência, a possibi- lidade de, querendo, e para além do mais, pronunciar-se sobre o referido parecer/petição inicial, contestando-o, contrapondo argumentos e indicando prova distinta da aduzida pelo administrador. 14. Esta amplitude na direcção do processo, concedida pelo legislador ordinário ao decisor judicial, assegura o cumprimento do mandato constitucional e garante o exercício, por parte do requerido/devedor no processo de insolvência, dos seus direitos, constitucionalmente radicados, de acesso aos tribunais, à prova, a um processo orientado para a justiça material, à proibição da indefesa e de exercício do contraditório, todos eles ínsitos nos n. os 1 e 4, do artigo 20.º, da Constituição da República Portuguesa. 15. Por fim, a título meramente subsidiário, para a hipótese que, sem conceder, admitimos, de que este Tri- bunal Constitucional entenda que é a interpretação normativa do artigo 17.º-G, n.º 4, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas desaplicada pelo tribunal a quo (e não a sua aplicação posterior ao caso concreto) que se revela inconstitucional, não poderá o mesmo, em nosso entender, deixar de, congruentemente com a sua jurisprudência anterior, determinar que o preceito mencionado seja, nos termos do disposto no artigo 80.º, n.º 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), interpretado em conformidade com a Constituição. 16. Por força do explanado, entende o requerente, Ministério Público, que deverá ser tomada decisão no sen- tido de julgar não inconstitucional a interpretação normativa artigo 17.º-G, n.º 4, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, ou, caso assim se não entenda, determinar o Tribunal Constitucional, ao abrigo do pres- crito no artigo 80.º, n.º 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), a interpretação conforme à Constituição do preceito mencionado, concedendo provimento ao presente recurso.» Cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação A) Do objeto do recurso 7. O presente recurso foi interposto ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, estando a sua admissibilidade dependente da verificação de dois pressupostos: i) que a decisão recorrida tenha recusado efe- tivamente a aplicação de certa norma ou interpretação normativa, relevante para a resolução do caso; e ii) que tal desaplicação normativa se funde num juízo de inconstitucionalidade do regime jurídico nela estabelecido. 8. Cumpre começar por fazer referência a uma questão prévia que, prima facie , poderia determinar a inutilidade do presente recurso. Com efeito, decorre dos autos que não obstante o processo de insolvência resultante do PER (e da emissão de parecer pela Administradora Judicial Provisória), em que a questão de

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