TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
621 acórdão n.º 400/17 «A título preliminar, deve notar-se que o legislador ordinário goza de ampla liberdade de fixação dos montantes das coimas aplicáveis, desde que respeitados os limites fixados pelo regime geral do ilícito contraordenacional e que as sanções aplicadas sejam “efetivas”, “proporcionadas” e “dissuasoras”, de modo a garantir o efeito preventivo daquelas, sob pena de os destinatários das normas não se sentirem compelidos a cumpri-las (com efeito, a fixação de coimas com montantes irrisórios face ao benefício colhido da prática do ilícito contraordenacional tende a enfraquecer o próprio cumprimento da lei; assim, ver Paulo Otero/Fernanda Palma, Revisão do Regime Legal do Ilícito de Mera Ordenação Social, in «RFDUL» (Separata), 1996, n.º 2, pp. 562 e 563). Neste sentido, o Tribunal Constitucional tem reconhecido ao legislador ordinário uma livre margem de decisão quanto à fixação legal dos montantes das coimas a aplicar (ver Acórdãos n.º 304/94, n.º 574/95 e n.º 547/00, todos disponíveis in www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ ), ainda que ressalvando que tal liberdade de definição de limites cessa em casos de manifesta e flagrante desproporcionalidade ou de excessiva amplitude entre os limites mínimo e máximo. A título de exemplo, através do Acórdão n.º 574/95 (disponível in www.tribunalconstitucional. pt/tc/acordaos/ ) – e ainda que tenha, naquela situação, afastado a inconstitucionalidade da norma extraída do n.º 16 do artigo 670.º do Código dos Valores Mobiliários) – o Tribunal Constitucional expressou o seguinte entendi- mento: “Quanto ao princípio da proporcionalidade das sanções, tem, antes de mais, que advertir-se que o Tribunal só deve censurar as soluções legislativas que cominem sanções que sejam desnecessárias, inadequadas ou mani- festa e claramente excessivas, pois tal o proíbe o artigo 18.º, n.º 2, da Constituição. Se o Tribunal fosse além disso, estaria a julgar a bondade da própria solução legislativa, invadindo indevidamente a esfera do legislador que, aí, há de gozar de uma razoável liberdade de conformação [cfr., identicamente, os acórdãos n. os 13/95 ( Diário da República , II série, de 9 de fevereiro de 1995) e 83/95 ( Diário da República , II série, de 16 de junho de 1995)], até porque a necessidade que, no tocante às penas criminais é – no dizer de Figueiredo Dias ( Direito Penal II, 1988, policopiado, página 271) – “uma conditio iuris sine qua non de legitimação da pena nos quadros de um Estado de direito democrático e social”, aqui, não faz exigências tão fortes. De facto, no ilícito de mera ordenação social, as sanções não têm a mesma carga de desvalor ético que as penas criminais – para além de que, para a punição, assumem particular relevo razões de pura utilidade e estratégia social.” Na sequência desta linha argumentativa, importa, pois, verificar se o montante mínimo fixado em 15.000 € para sancionar a recusa de apresentação do livro de reclamações, por uma pessoa coletiva, num caso em que, reque- rida a presença da autoridade para remover a referida recusa, ela é removida, sendo o livro de reclamações facultado ao utente, é (ou não) desproporcionado. Desde logo, verifica-se que o n.º 3 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 156/2005 determina que a agravação do montante mínimo da coima aplicável depende da “ocorrência da situação prevista no n.º 4 do mesmo artigo [3.º]”. O referido preceito legal ( supra transcrito) determina, pois, que a falta de apresentação do livro de reclamações permite ao utente requerer a presença de autoridade policial com vista a colocar termo à referida recusa de apre- sentação. Note-se que o preceito é suscetível de se aplicar a duas situações distintas: i) por um lado, a pessoa coletiva pode persistir na recusa de facultar o livro de reclamações ao consumidor, mesmo que interpelado pela autoridade policial; ii) por outro lado, face à intervenção da autoridade policial, a pessoa coletiva pode conformar-se com o cumprimento da lei – como sucedeu no caso em concreto ora em apreço. Não obstante a diversidade de situações poder ser ponderada pelo tribunal competente para conhecer da impugnação da sanção contraordenacional, quer para efeitos de determinação da aplicabilidade daquela norma agravadora às situações em que a pessoa coletiva ade- qua a sua conduta ao Direito, cumprindo o dever legal de apresentação do livro de reclamações, quer para efeitos de determinação da medida concreta da pena, em função da culpa manifestada, a verdade é que, quer num caso quer
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=