TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
60 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL prevalecer sobre o valor da transação, quando superiores, os valores por que os bens houvessem sido consi- derados para efeitos de liquidação de IMT (imposto municipal sobre as transações onerosas de imóveis) ou, não havendo lugar a esta liquidação, os que devessem ser, caso fosse devida. Sobre esse entendimento, assim se pronuncia o Juiz: «simplesmente a interpretação que a Administração fiscal faz do n.º 2 do artigo 44.º torna aquela presunção inilidível o que não é de todo aceitável» (cfr. fls. 101). Isto, já que segundo o Juiz, «tal interpretação fere de forma grosseira o principio da capacidade contributiva, o qual é um corolário do princípio da igualdade» ( idem ). Recorda o Juiz que «no que respeita às leis fiscais, concretamente às normas de liquidação e de deter- minação da matéria colectável, apesar de não figurarem no n.º 2 do artigo 103.º da CRP quanto à garantia substantiva de reserva de lei, têm de se haver inequivocamente como nela abrangidas» para concluir que «qualquer presunção inilidível consagrada no CIRS, especialmente em sede de determinação da matéria colectável, é inconstitucional por violação do princípio da igualdade, e das presunções jure et de jure das normas de incidência tributária» (cfr. idem , fls. 102). Nesta sequência, decide o Juiz, na sentença ora recorrida, «recusar a aplicação do n.º 2 do artigo 44.º do CIRS no caso dos autos, com fundamento na sua inconstitucionalidade material, por violação dos artigos 103.º, n.º 2, 165.º, n.º 1, alínea i) da CRP» (cfr. sentença recorrida, fls. 102 e 102-verso). 10. Ora, não obstante na referida parte decisória da sentença, o Juiz do tribunal a quo se limitar a «recusar a aplicação do n.º 2 do artigo 44.º do CIRS», aí não enunciando formalmente uma dimensão inter- pretativa extraída da norma em causa, não pode deixar de levar-se em conta, no confronto do pedido com a decisão recorrida, que decorre da fundamentação da mesma uma dimensão interpretativa do n.º 2 do artigo 44.º do CIRS desaplicada. Tal dimensão interpretativa do n.º 2 do artigo 44.º do CIRS, desaplicada pelo juiz a quo e formulada a partir da interpretação daquela norma imputada à Administração Fiscal, é aquela segundo a qual (para efeitos da determinação dos ganhos sujeitos a IRS relativos a mais-valias decorrentes da alienação onerosa de bens imóveis) – ali se estabelece uma «presunção inilidível» ou uma «presunção abso- luta» (cfr., em especial, decisão recorrida, a fls. 101). 11. Acresce referir que, no caso dos autos, e como decorre da própria decisão recorrida, a questão de constitucionalidade colocada respeita à recusa de aplicação de uma das possíveis interpretações da norma legal em causa – a que considera estarmos na presença de uma presunção absoluta ou inilidível –, entendendo-se superada a mesma questão de constitucionalidade se o sentido normativo fosse outro, como o próprio Juiz a quo entende dever ser – o de que a referida norma contém uma presunção ilidível. Tenha-se, porém, aqui em conta que, por regra, não cumpre ao Tribunal Constitucional pronunciar-se sobre o sentido e o modo das interpretações – de sentido divergente – alegadamente derivadas da norma legal em causa, nem adotar qualquer um dos sentidos normativos em confronto na decisão recorrida, mas tão só apreciar a constitucionalidade da «norma» cuja aplicação foi afastada, a qual, na economia do presente aresto, constituirá o respetivo objeto. Como já se escreveu (cfr. Acórdão n.º 276/04 – disponível, bem como os demais citados, em www. tribunalconstitucional.pt ): «(…) Conforme tem sido reiteradamente afirmado, não cabe ao Tribunal Constitucional dirimir conflitos de interpretação de normas infraconstitucionais, nem determinar qual a melhor interpretação dessas normas (melhor, no sentido de que a ela conduz mais directamente a observância estrita dos cânones hermenêuticos). Por outro lado, é certo que, existindo mais do que uma interpretação possível da norma em causa, deverá este Tribunal pon- derar se não será de tomar como dado uma interpretação que, embora tida por menos boa ou até por inconstitu- cional, seja, todavia, a adoptada pelos tribunais.»
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