TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

588 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL as pessoas ou situações diferenciadas pela lei; no caso dos limites de velocidade, cuja finalidade é mitigar o risco de acidentes e dos danos emergentes da sua ocorrência, o tertium comparationis são as propriedades dos veículos que os tornam mais ou menos perigosos e mais ou menos aptos a provocar danos em caso de acidente – contando-se entre tais propriedades a massa do veículo, mas não a origem do seu construtor.» O PER foi criado através da Lei n.º 16/2012, de 20 de abril, a qual veio alterar o CIRE. Trata-se de um processo especial destinado à «revitalização» de devedores em situação económica difícil ou de insolvência iminente. Os motivos que conduziram à sua criação, e aos quais o tribunal recorrido atribuiu relevância decisiva na interpretação da lei, foram explicitados na Proposta de Lei n.º 39/XII: «O principal objetivo prosseguido por esta revisão passa por reorientar o Código da Insolvência e Recuperação de Empresas para a promoção da recuperação, privilegiando-se sempre que possível a manutenção do devedor no giro comercial, relegando-se para segundo plano a liquidação do seu património sempre que se mostre viável a sua recuperação. (…) O processo visa propiciar a revitalização do devedor em dificuldade, naturalmente que sem pôr em causa os respetivas obrigações legais, designadamente para regularização de dividas no âmbito das relações com a adminis- tração fiscal e a segurança social. O processo especial de revitalização pretende assumir-se como um mecanismo célere e eficaz que possibilite a revitalização dos devedores que se encontrem em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente mas que ainda não tenham entrado em situação de insolvência atual. A presente situação económica obriga, com efeito, a gizar soluções que sejam, em si mesmas, eficazes e eficientes no combate ao “desaparecimento” de agentes económicos, visto que cada agente que desaparece representa um custo apreciável para a economia, contribuindo para o empobrecimento do tecido económico português, uma vez que gera desemprego e extingue oportunidades comerciais que, dificilmente, se podem recuperar pelo surgimento de novas empresas. Este processo especial permite ainda a rápida homologação de acordos conducentes à recuperação de devedores em situação económica difícil celebrados extrajudicialmente, num momento de pré-insolvência, de tal modo que os referidos acordos passem a vincular também os credores que aos mesmos não se vincularam, desde que respeitada a legislação aplicável à regularização de dívidas à administração fiscal e à segurança social e observa- das determinadas condições que asseguram a salvaguarda dos interesses dos credores minoritários.» De acordo com estas passagens, a criação do PER visou a manutenção no «giro comercial» do deve- dor cuja atividade económica é recuperável, tendo em conta os custos para a economia que representa o «desaparecimento de agentes económicos», em função do seu valor comercial e dos postos de trabalho que asseguram. Ora, os «agentes económicos» em causa são, essencialmente, as empresas – «organização de capital e trabalho destinada ao exercício de qualquer atividade económica», nos termos da definição consagrada no artigo 5.º do CIRE –, em virtude, quer do facto de elas terem um valor comercial (o chamado «aviamento» ou « goodwill ») que ultrapassa o valor do património que lhes está afeto, valor esse que necessariamente se perde com a sua desintegração, quer do facto de empregarem, em maior ou menor medida, o fator trabalho no processo produtivo. Em suma, segundo a interpretação acolhida pelo tribunal recorrido, a finalidade visada pelo legislador foi a proteção do tecido empresarial. Daí se segue que o termo de comparação pertinente entre os sujeitos a tratamento desigual é a natureza – empresarial ou não-empresarial – da sua atividade. Desse ponto de vista, nada há, evidentemente, de arbitrário na solução legal, uma vez que, no universo das pessoas singulares, apenas os comerciantes ou empresários em nome individual têm as características que justificam o PER – características essas que, recorde-se, o tribunal recorrido entendeu que os ora recorrentes não possuem. Conclui-se, pois, que a norma sindicada não viola o princípio geral da igualdade, consagrado no n.º 1 do artigo 13.º da Constituição.

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