TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

564 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL uma restrição que se limita ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos (artigo 18.º, n.º 2 da CRP). XLVII. Este regime legal é perfeitamente adequado a um setor de atividade com poucos e economicamente pode- rosos operadores, no qual é difícil implementar e garantir medidas efetivas de defesa da concorrência (Cf. Juiz Conselheiro José António Teles Pereira, na sua declaração de voto de vencido ao Acórdão n.º 675/16). XLVIII. Com efeito, os agentes económicos visados pelos processos de contraordenação da ERSE são, em regra, empresas com avultada capacidade económica (nomeadamente, empresas do grupo EDP e do grupo Galp ou a REN Redes Energéticas Nacionais), dada a especificidade do setor energético e o número limitado dos seus agentes. XLIX. A A. integra o Grupo B. S.G.P.S., do qual fazem ainda parte, para além da visada, a C., S. A., a B1, S. A. e a B2 GNV. L. A visada é responsável pela comercialização de gás natural e de eletricidade em regime de mercado, tendo à data mais de 200 000 clientes. Já a C., atua como operador de redes de distribuição local de gás natural (em regime exclusivo, de monopólio), abastecendo todos os clientes num relevante número de concelhos (Macedo de Cavaleiros, Mirandela, Peso da Régua, Santa Marta de Penaguião, Arcos de Valdevez, Ponte da Barca e Póvoa de Lanhoso), tendo apresentado um volume de negócios no ano de 2015 que ascendeu a 13.400,00 milhares de euros. As demais empresas do Grupo dedicam-se à comercialização de gás propano (derivado de petróleo) e de gás natural veicular (utilizado em veículos como alternativa aos combustíveis convencionais). LI. A norma em análise demonstra-se adequada (ou idónea) a prosseguir o seu fim: é evidente que a sujeição do efeito suspensivo do recurso ao pagamento de uma caução e à invocação de um prejuízo considerável demoverá propósitos infundados e meramente dilatórios do visado, desincentivando o recurso à impugna- ção judicial infundada das decisões da ERSE. LII. A norma deverá considerar-se também necessária ao prosseguimento dos objetivos delineados para satisfazer o interesse público, na medida em que visa evitar delongas processuais infundadas e que geram dificuldades acrescidas não só ao prosseguimento dos processos mas também, consequentemente, à garantia da regulari- dade do setor energético – que é um setor de indústrias de rede, necessariamente interoperativo e, em boa medida, network dependent . LIII. A avaliação do TCRS de que a norma, “podendo ser eficaz, é demasiado gravosa”, bem como a apreciação do Tribunal Constitucional (Acórdão n.º 674/16) no sentido de considerar que o legislador pode configurar outras medidas menos restritivas para alcançar o mesmo fim, não estão a tomar na devida linha de conta o juízo de ponderação e adequação que deverá ser realizado pelo juiz às necessidades do caso concreto. LIV. A prestação de caução não tem necessariamente de se traduzir na imposição de um ónus de efeito equivalen- te ao cumprimento da coima, isto é, não obriga ao pagamento total antecipado da coima. Existe margem de interpretação normativa para se considerar que cabe ao juiz realizar o teste da justa medida, fornecendo ao caso concreto uma solução que se revele adequada (ou idónea), necessária (ou indispensável) e proporcional. LV. Termos em que se conclui que o artigo 46.º, n. os 4 e 5 do RSSE não afronta o princípio da proporciona- lidade (nem nenhum dos Subprincípios em que comummente este se desdobra: idoneidade, necessidade e justa medida), na medida em que a autonomia que assiste ao juiz neste domínio permitirá a aplicação ao caso concreto de uma medida que não se apresente excessiva para atingir os fins visados. LVI. Na medida em que a atribuição de efeito meramente devolutivo se inscreve, ainda, dentro da margem de liberdade do legislador na modelação do regime processual da impugnação, sacrificar o regime do artigo 46.º, n. os 4 e 5 do RSSE é prejudicar a eficácia potencial do sistema sancionatório do setor energético e, nessa medida, a realização dos interesses que tutela –, sem que, do lado do impugnante se salvaguarde uma posição especialmente carecida de tutela, perante a margem de apreciação que a norma, apesar de tudo, ainda permite (Cf. Juiz Conselheiro José António Teles Pereira, na sua declaração de voto de vencido ao Acórdão n.º 675/16).

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