TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

55 acórdão n.º 211/17 Todavia, o n. º 2 deste artigo consagra a regra que sempre que o valor da escritura seja inferior ao valor que serviu de base à liquidação do IMT, este valor prevalece corro valor de realização. Porém, tal disposição, deve ser interpretada no sentido de que aqui o legislador estabeleceu uma presunção sobre o valor de realização, que cede perante prova em contrário, ou seja, prova de que o valor de realização foi efectivamente inferior ao valor tomado como base para a liquidação do IMT. (No mesmo sentido, apesar de não abordar directamente esta questão, cfr. José Guilherme Xavier de Basto, IRS, Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra, p. 446 e seguintes). Se admitirmos qualquer outra interpretação, a Administração Fiscal estaria a tributar não o rendimento real operado pela transmissão mas um rendimento normal Por outro lado, se se tratar de uma presunção, o sujeito passivo pode provar que o valor de realização foi efectivamente infe- rior. Aliás, se não qualificarmos esta regra como uma presunção ilidível, estaríamos a criar uma norma de determi- nação da matéria colectável susceptível de violar o princípio da capacidade contributiva. Sublinhe-se, todavia, que esta técnica legislativa [a utilização de presunções], movida por legítimas preocupa- ções de simplificação e de praticabilidade das leis fiscais, tem de compatibilizar-se com o princípio da capacidade contributiva, o que passa, pela ilegitimidade constituída das presunções absolutas, na medida em que obstam à prova da inexistência da capacidade contributiva visada na respectiva lei (cfr. José Casalta de Nabais, O Dever Fun- damental de Pagar Impostos, p. 498). E foi por esta razão que o legislador da LGT vem afastar expressamente, para o campo da incidência fiscal, as presunções inilidíveis. Na verdade, à luz do art. 73.º da LGT, não se pode admitir no CIRS qualquer presunção, que não admita prova em contrário, que determine que o valor da realização de um imóvel não seja o valor efectivamente realizado. Refira-se também que o legislador do CIRC já consagrou tal princípio no art. l39.º, o qual admite que o sujeito passivo possa fazer prova de que o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre bens imóveis foi inferior ao valor patrimonial E por este motivo o Tribunal não descortina a razão para interpretar uma disposição do CIRS que permita criar um tratamento desigual entre os contribuintes sujeitos às regras do CIRS e os contribuintes sujeitos às regras do CIRC, sem uma justificação plausível. Dito isto, vejamos o caso concreto. Dos factos assentes resulta que em 16 de outubro de 2006 a Impugnante, por escritura pública, vendeu um imóvel, sito em Leiria, pelo preço de 150 000 € . Também está provado que a Administração Fiscal procedeu posteriormente à avaliação do imóvel objecto dos presentes autos, tendo atribuído o valor patrimonial de 350 790 € . E consta do probatório que a Impugnante autorizou a Administração Fiscal a aceder às suas contas bancárias. Ora, conjugando os factos dados como assentes com as disposições normativas supra referidas, podemos desde já adiantar que não tem razão a Fazenda Pública. Na verdade, como já vimos, a imputação da matéria colectável estabelecia no n.º 2 do art. 44, há-de se recon- duzir, ainda assim, a uma presunção legal que, face ao disposto no art. 73.º da LGT deve ter-se por ilidível (embora o ónus de tal ilisão caba ao contribuinte). Mas no caso dos autos, nem importará apurar se a Impugnante logrou ilidi-la, porque simplesmente a inter- pretação que a Administração Fiscal faz do n.º 2 do art. 44.º torna aquela presunção inilidível o que não é de todo aceitável. Repare-se, também, que a AF não impugna sequer o valor da transacção, aceitando que o valor declarado pelo sujeito passivo é o valor real. Desta feita, tal interpretação fere de forma grosseira o princípio da capacidade contributiva, o qual é um coro- lário do princípio da igualdade, porque aqui estamos perante um poder discricionário do legislador ao estabelecer à Impugnante um rendimento presumido para efeitos de tributação, mesmo violando a sua capacidade contributiva. Por outro lado, note-se que de acordo com o probatório a Impugnante autorizou a AF a derrogar o sigilo bancário. E se assim foi, a AF deveria ter admitido a possibilidade de corrigir o valor da realização, independentemente do valor da avaliação para efeitos de IMT ser superior ao valor real da transacção. Perante a existência da autoriza- ção de derrogação do sigilo bancário que a AF não utilizou, e com base no principio do inquisitório que norteia

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