TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
542 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL princípio do Estado de direito; os benefícios e os sacrifícios da medida incidem, pois, sobre o mesmo bem, o da integridade probatória do processo penal. V – Ora, nos casos em que o fim e o meio incidem sobre o mesmo bem, a questão que se coloca é a de saber se o meio lesivo é inepto, inexigível e desproporcionado para atingir o fim valioso; no caso vertente, trata-se de determinar se o sacrifício de depoimentos com valor probatório positivo de interditos por anomalia psíquica é um meio excessivo – por inepto, inexigível ou desproporcionado – para atingir a finalidade de excluir depoimentos com valor probatório negativo, em virtude da falta de idoneidade da testemunha ou de credibilidade do depoimento. VI – Embora a aptidão da medida pareça assegurada pela aparente convergência entre o pressuposto da interdição – a anomalia psíquica – e a inidoneidade para testemunhar, essa convergência não é real, porque o juízo em que se baseia a decisão de declarar a interdição tem fundamentos – a incapacidade do visado de reger a sua pessoa e bens –, e finalidades – a tutela dos interesses do próprio visado –, muito diversos das que presidem ao juízo relativo à idoneidade para testemunhar, pelo que a incapaci- dade absoluta dos interditos por anomalia psíquica de testemunharem em juízo não é um meio apto a eliminar a valoração de depoimentos sem valor probatório; não o é, porque não está assegurada a coin- cidência substancial entre os dois universos, o dos sujeitos abrangidos pela incapacidade e a daqueles que através dela se pretende atingir, bastando que não seja essencialmente apta a atingir a finalidade a que se destina, para que seja considerada excessiva. VII – Acresce que a solução legal sob escrutínio não passaria, em caso algum, os testes da exigibilidade e da proporcionalidade; o primeiro, na medida em que é claro que o fim visado pela medida – a exclusão de depoimentos com valor probatório negativo – pode ser adequadamente assegurado através de um regime de incapacidade relativa, nos termos do qual a idoneidade para depor de testemunha que padece de anomalia psíquica é julgada em cada caso, atentas a natureza e o grau da anomalia psíquica e a natureza e pertinência do respetivo depoimento; o segundo, em virtude de que a modestíssima eficácia da medida na exclusão de depoimentos com valor probatório negativo não pode justificar o sacrifício de depoimentos com valor probatório positivo de interditos por anomalia psíquica, sobretu- do quando se tate do próprio ofendido, pelo que se conclui que a norma objeto do presente recurso é inconstitucional, por violação do princípio do processo equitativo, conjugado com o princípio da proibição do excesso. Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo Local Criminal de Fafe, em que é recorrente o Ministério Público e recorrido A., foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do despacho daquele Tribunal, de 14 de novembro de 2016.
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