TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
521 acórdão n.º 395/17 (…) Em face das referidas posições, não é de afastar a natureza interpretativa atribuída ao n.º 21 do artigo 88.º do CIRC que se faz no artigo 135.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, à luz dos ensinamentos de BATISTA MACHADO, pois a solução que dele resulta sobre a aplicação do agravamento da tributação autónoma prevista no n.º 14 do artigo 88.º do CIRC nos casos de tributação no âmbito do RETGS passa o teste enunciado por este Autor: – a solução que resultava do teor literal do artigo 88.º, n.º 14, do CIRC era controvertida e a solução definida pela nova lei situa-se dentro dos quadros da controvérsia; – o julgador ou o intérprete poderiam chegar a essa solução sem ultrapassar os limites normalmente impostos à interpretação e aplicação da lei, como chegaram a jurisprudência e doutrina referidas. Sendo assim, o afastamento da aplicação da interpretação efetuada pelo n.º 20 do artigo 88.º da Lei n.º 7-A/2016, só pode resultar da eventual inconstitucionalidade, alegada pela Requerente. 3.3. Questão da inconstitucionalidade da interpretação autêntica efetuada pelo n.º 20 do artigo 88.º da Lei n.º 7-A/2016 A eequerente defende que a interpretação defendida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, que veio a ser perfilhada no n.º 20.º do artigo 88.º do CIRC, viola a Constituição, pelos seguintes razões, em suma: «Tal sorte de interpretação normativa para aplicação retroativa não viola apenas o artigo 103.º, n.º 3, da Constituição, designadamente a proibição de retroatividade dos impostos aí prevista. Viola também o princí- pio da separação de poderes e o princípio da independência do poder judicial. Viola, pois, também, o artigo 2.º (Estado de direito democrático, e separação e interdependência de poderes, sendo que quanto a este último aspeto no caso está em causa a perspetiva da interdependência – e por conseguinte negação de excessos e de ocupação de espaço que não lhe pertence – do poder político-legislativo face ao poder judicial), o artigo 111.º, n.º 1 [separação e interdependência dos órgãos de soberania, que é ainda um limite material de revisão – artigo 288.º, alínea i) , da Constituição], e o artigo 203.º [independência dos tribunais, outro limite material de revi- são – artigo 288.º, alínea m) , da Constituição], todos da Constituição.». 3.3.1. Violação do princípio da retroatividade dos impostos O artigo 103.º, n.º 3, da CRP estabelece que ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que tenham natu- reza retroativa. A lei interpretativa, integrando-se na lei interpretando, nos termos do artigo 13.º do Código Civil, tem for- çosamente efeitos anteriores à sua vigência, pelo menos o de eliminar uma ou mais das interpretações possíveis da lei interpretada. (…) A proibição constitucional de retroatividade das normas criadoras de obrigações fiscais que se retira do n.º 3 do artigo 103.º da CRP visa obstar a violações legislativas do princípio da segurança jurídica, nas suas vertentes de certeza na orientação das condutas dos contribuintes e de segurança dos efeitos criados por situações já ocorridas. Na esteira da lição de Batista Machado, deverá entender-se que nas situações em que a interpretação que é dada na lei nova vem fixar uma das interpretações possíveis da lei antiga com que os interessados podiam e deviam contar não é suscetível de violar expectativas seguras e legitimamente fundadas, pelo que não se verificam as razões que justificam a proibição da retroatividade. Como interpretações possíveis da lei antiga com que os interessados podiam e deviam contar não se poderão considerar aquelas que extravasam, restritiva ou extensivamente, o seu teor literal, pelo menos enquanto não hou- ver posições doutrinais ou prática jurisprudencial que as adotem, mas incluem-se, seguramente, aquelas que são viáveis à face do texto legal anterior numa mera interpretação declarativa. Como se referiu já, o teor literal do n.º 14 do artigo 88.º do CIRC permite, por mera interpretação declarativa, que tenha em mente o conceito de sujeito passivo alargado que resulta dos artigos 18.º, n.º 3, da LGT e 115.º
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