TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
502 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL um regime de impugnação diferenciado: a decisão sumária, impugnada imediatamente por via de recurso; os despachos, impugnados através da reclamação para a conferência. Todavia, para efeitos do n.º 2 do artigo 27.º não se pode fazer tal distinção, quer porque nos tribunais superiores a lei veda o recurso dos despachos ou decisões do relator, quer porque não corresponderia ao sen- tido visado pelo legislador quando introduziu tal norma no sistema jurídico-processual: «no que respeita ao julgamento do recurso, amplia-se muito significativamente o elenco das competências atribuídas ao relator, permitindo-lhe inclusivamente julgar, singular e liminarmente, o objeto do recurso, nos casos de manifesta improcedência ou de o mesmo versar sobre questões simples e já repetidamente apreciadas na jurisprudência. Pretende-se com tal faculdade dispensar a intervenção – na prática em muitos casos puramente formal – da conferência na resolução de questões que podem perfeitamente ser decididas singularmente pelo relator, ficando os direitos das partes acautelados pela possibilidade de reclamarem para a conferência da decisão proferida pelo relator» [cfr. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de dezembro]. Ora, se nos tribunais superiores não há razões decisivas para autonomizar as decisões sumárias dos demais despachos no que se refere ao regime de impugnação, nos tribunais administrativos de primeira ins- tância é bastante controversa a reclamação para a conferência das decisões que julgam sumariamente a causa. O n.º 3 do artigo 94.º do CPTA prevê que a «sentença» ou «acórdão» proferidos na fase de julgamento possam conter uma decisão sumária. À semelhança do que sucede no processo civil (n.º 5 do artigo 663.º do CPC), por razões de economia e simplificação processual, faculta-se ao juiz ou relator, quando considere que a questão de direito a resolver é simples, a possibilidade de limitar a sentença ou o acórdão à parte decisória, precedida de fundamentação sumária. A prolação de decisão sumária apenas tem lugar em duas situações: (i) quando a questão de direito a resolver seja simples, designadamente por já ter sido apreciada por tribunal, de modo uniforme e reiterado; (ii) quando a pretensão seja manifestamente infundada. Ou seja, o juiz pode optar por uma decisão sumária quando a ação verse sobre aspetos que foram já analisados pela jurisprudência de modo uniforme (seja pelos tribunais de primeira instância, seja pelos tribunais superiores), sem que tenha sido aduzida argumentação inovadora e suscetível de pôr em causa a corrente jurisprudencial já formada, caso em que basta ao juiz ou relator remeter para as precedentes decisões, de que juntará cópia; ou quando, pela análise meramente liminar dos fundamentos invocados seja possível concluir, com segurança, que as questões suscitadas são manifestamente improcedentes. Os pressupostos da sentença (ou acórdão) sumária proferida na fase de julgamento são idênticos aos previstos na alínea i) do n.º 1 do artigo 27.º do CPTA. A única diferença que parece existir é quanto ao momento processual em que releva cada uma das normas: enquanto esta está pensada para o momento inicial do processo, em que se pode decidir liminarmente o seu objeto, a do n.º 3 do artigo 94.º reporta- -se à decisão final (sentença ou acórdão) do processo, após encerrada audiência pública e/ou apresentadas alegações escritas. Aplicando subsidiariamente o que neste ponto resulta do CPC, a decisão sumária prevista na alínea i) do n.º 1 do artigo 27.º do CPTA é uma decisão liminar de mérito que só pode ter lugar antes do julgamento em conferência; já a norma do n.º 3 do artigo 94.º, em termos idênticos ao n.º 5 do artigo 663.º do CPC, apenas se aplica às sentenças ou acórdãos proferidos após discussão e julgamento da causa. Na redação anterior ao Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, a doutrina defendia que o artigo 27.º, referindo-se aos «poderes do relator», em correspondência com o estabelecido no atual artigo 652.º do CPC (anterior artigo 700.º), abrangia, em contencioso administrativo, não apenas a competência do relator nos tribunais superiores relativamente à tramitação dos recursos jurisdicionais, mas também a competência do juiz a quem o processo fosse distribuído nos tribunais administrativos de círculo, nos casos em que o julgamento da matéria de facto e de direito devesse pertencer a uma formação de três juízes, o que sucedia relativamente às ações administrativas especiais de valor superior à alçada (cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Cadilha, ob. cit., p. 156, e Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Vol. I, Almedina, p. 220). De facto, os tribunais administrativos de círculo funcionam com juiz singular competindo a cada juiz o julgamento de facto e de direito dos processos que lhe sejam distribuídos (artigo 40.º, n.º 1, do ETAF).
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