TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

494 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Há ainda a notar que, se é verdade que o menor prazo para deduzir a reclamação, relativamente ao que é concedido para a interposição de recurso, faz perigar a impugnabilidade da respetiva decisão em situações em que se gera uma incerteza sobre a necessidade de utilizar o primeiro daqueles meios impugnatórios, a consequência da utilização do recurso para além do prazo concedido para reclamar não é necessariamente a perda do direito de impugnar, consequência que não é assumida pela interpretação normativa  sub iudicio , sendo possível, numa linha interpretativa, convolar o meio utilizado para o meio devido (vide, neste sentido, Armindo Ribeiro Mendes, em Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 97, pp. 33-36). Não se contando entre as competências do Tribunal Constitucional a fiscalização do modo como determinada norma foi aplicada no caso concreto e não existindo no conteúdo normativo impugnado fatores que prejudiquem seriamente a previsibilidade pelos destinatários do meio de impugnação que devem utilizar para obterem uma reapreciação de uma decisão proferida ao abrigo da competência prevista no artigo 27.º, n.º 1, i) , do CPTA, não há motivos para que se considere aquela interpretação normativa ofensiva do direito ao processo equitativo na dimensão em que reflete os princípios inerentes a um Estado de direito da confiança e da segurança jurídica. O Tribunal Constitucional não ignora, até pelo que lhe é espelhado nos inúmeros processos que lhe têm chegado, tendo por objeto esta temática, que devido a uma utilização questionável das decisões previstas no artigo 27.º, n.º 1, i) , do CPTA, e a uma contemporização inicial generalizada com a utilização do recurso como meio de impugnação dessas decisões, muitos recorrentes poderão ter sido surpreendidos por decisões de não admis- são do recurso por eles interposto antes de fixação de jurisprudência nesse sentido pelo Supremo Tribunal Adminis- trativo. Não se exclui que tal facto possa ter gerado situações de perda do direito ao reexame da decisão – situações, aliás, preveníveis ou suscetíveis de correção, nas instâncias pela via interpretativa acima apontada. O recurso de constitucionalidade é que não pode ser adequadamente utilizado para esse efeito. Na verdade, não pode o Tribunal Constitucional, sob pena de entorse aos seus poderes funcionais, julgar inconstitucional, com fundamento numa situação de incerteza ocorrida no passado, uma interpretação normativa que não reflete tais circunstâncias tem- poralmente localizadas, fazendo uso dos dados do caso concreto, com o resultado da avaliação da conformidade constitucional desta norma ficar casuisticamente dependente de dados circunstanciais estranhos ao conteúdo da norma em si. Tendo em consideração que no domínio da fiscalização concreta, a competência atribuída ao Tribunal Cons- titucional pela Constituição cingese ao controlo da inconstitucionalidade normativa, ou seja, das questões de des- conformidade constitucional imputada a normas jurídicas ou a interpretações normativas aplicadas pelas decisões das quais seja interposto recurso para este Tribunal e que a interpretação normativa sindicada não viola o direito ao recurso, enquanto expressão do direito a uma tutela jurisdicional efetiva, consagrado no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição, conforme se concluiu no Acórdão n.º 846/13, nem o direito a um processo equitativo, na dimensão em que reflete os princípios inerentes a um Estado de direito da confiança e da segurança jurídica, consagrado nos artigos 20.º, n.º 4, e 2.º da Constituição, nem se afigura que ofenda qualquer outro parâmetro constitucional, deve o recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional ser julgado procedente, revogando-se o Acórdão n.º 124/15 e julgando-se improcedente o recurso interposto para o Tribunal Constitucional (...).» 10. Este entendimento permanece válido e é inteiramente transponível para o presente recurso. Efetiva- mente, o recorrente esgrime argumentos e afirma a violação dos parâmetros constitucionais já equacionados pelo Tribunal no Acórdão n.º 577/15, em termos que merecem concordância. Aduz apenas a violação do princípio da legalidade e da independência dos tribunais, argumentação inteiramente fundada em parâmetros de direito infraconstitucional e votada à censura do próprio ato de jul- gamento, mormente porque não se afastou da jurisprudência uniformizada [cfr. conclusões Z) , AA) e NN) ] e, por isso, insuscetível de fundar julgamento de inconstitucionalidade do sentido normativo questionado. Assim, também nestes autos, cumpre concluir por julgamento de não inconstitucionalidade da inter- pretação normativa em controlo.

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