TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
457 acórdão n.º 382/17 d) , da LPCJP visou permitir a continuação da aplicação da medida de apoio para a autonomia de vida, nos mesmos termos em que esta vinha sendo aplicada – ou seja, com o acompanhamento técnico e a reavaliação periódica na base dos relatórios sociais –, tendo em vista possibilitar que a respetiva beneficiária completasse a sua formação profissional ou académica. Por outras palavras, o tribunal a quo pretendeu afastar o caráter necessário da cessação da medida em razão da circunstância única de a respetiva beneficiária ter completado os 21 anos de idade. Daí poder enunciar-se o objeto material do presente recurso nos seguintes termos: está em causa a apre- ciação da constitucionalidade do artigo 63.º, n.º 1, alínea d) , da LPCJP, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, na redação dada pela Lei n.º 142/2015, de 8 de setembro, interpretado no sentido de a medida de apoio para a autonomia de vida que se mantém em vigor durante a maioridade do seu beneficiário, a fim de permitir que este conclua a sua formação profissional ou académica, cessa necessariamente quando o mesmo complete os 21 anos de idade. B) Enquadramento infraconstitucional 5. A apreciação da constitucionalidade da norma recusada aplicar pelo tribunal a quo pressupõe a deter- minação do respetivo significado e alcance. A mesma norma reporta-se a uma medida concreta de promoção e proteção de crianças ou jovens, que se inscreve num regime – o da LPCJP – com uma finalidade e lógica próprias. De resto, tal necessidade de compreensão sistemática decorre claramente dos parâmetros constitu- cionais mobilizados pela decisão recorrida (o princípio da igualdade) e pelo recorrente (além da igualdade, também o princípio da proporcionalidade e o direito a um mínimo de existência condigna) para sustentar o juízo de inconstitucionalidade que formulam. Assim, e sem prejuízo da estrita observância dos poderes de cognição deste Tribunal estatuídos no artigo 79.º-C da LTC, importará começar por analisar a norma desa- plicada no quadro do específico sistema de proteção em que se inscreve. Só num segundo momento se pro- cederá ao confronto do mesmo sistema com as exigências constitucionais em matéria de proteção de crianças e jovens e, bem assim, à comparação com as demais soluções legais estabelecidas em razão de tais exigências. 6. A LPCJP teve a sua origem na Proposta de Lei n.º 265/VII, que, na respetiva exposição de motivos, salientava que a intervenção junto de crianças e jovens que se encontram em perigo se funda no artigo 69.º da Constituição, que confere à sociedade e ao Estado o dever de os proteger «contra todas as formas de abandono, de discriminação e opressão e contra o exercício abusivo da autoridade, com vista ao seu desen- volvimento integral. Sendo tarefa dos pais, da família e da sociedade, que o Estado deve apoiar e enquadrar, a cooperação de todas estas entidades e o seu envolvimento nas situações suscetíveis de pôr em perigo a segurança, a saúde, a formação moral e a educação das crianças e dos jovens constituem formas de promover os seus direitos» (cfr. Diário da Assembleia da República , 2.ª série-A, de 17 de abril de 1999, p. 1516). Afir- mando o objetivo de operar uma mudança no paradigma de intervenção, afirma-se: «[O] epicentro da justiça de menores desloca-se da mera proteção da infância para a promoção e proteção dos direitos das crianças e dos jovens. Esta conceção resulta, nomeadamente, da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, que adota uma abordagem integrada dos direitos da criança, ao reconhecer que o seu desenvolvimento pleno implica a realização de direitos sociais, culturais, económicos e civis e ao estabelecer um equilíbrio entre os direitos das crianças e dos seus responsáveis legais, concedendo àquelas o direito de participar nas decisões que lhe dizem respeito, de acordo com uma perspetiva global de responsabilidade e solidariedade social. Configura-se, assim, um novo modelo de justiça de menores que, superando os anteriores, assenta no prin- cípio de que as crianças e jovens são atores sociais, cuja proteção deve ser sinónimo de promoção dos seus direitos individuais, económicos, sociais e culturais» (v. ibidem ).
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