TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

442 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL junto do local de fabrico ou teste do equipamento em aquisição, era um “caso omisso” que habilitava a Administração a criar uma “remuneração adicional”, mas apenas com a natureza de ajudas de custo. 11. Ao menos para efeitos do princípio da irredutibilidade da retribuição, a remuneração adicional, assente numa lógica compensatória ou indemnizatória, não tem a proteção do direito fundamental à retri- buição consagrado na alínea a) do n.º 1 do artigo 59.º da CRP. Como já foi referido, não há um direito fundamental à não redução da retribuição, ainda que por apelo à cláusula aberta do n.º 1 do artigo 16.º da Constituição ou ao princípio da proibição do retrocesso social. E se não há suporte constitucional para garantir a irredutibilidade das prestações que têm natureza retributiva, por maioria de razão não existe para os acréscimos remuneratórios que apenas se destinam a compensar despesas efetuadas por facto de serviço. Não estando em causa a afetação do direito fundamental à retribuição, a irredutibilidade apenas poderá resultar do respeito pelo princípio da proteção da confiança, também invocada pelos requerentes. De acordo com o entendimento estavelmente firmado na jurisprudência constitucional, o princípio da confiança, para além de caracterizado pela fluidez de contornos e pelo relativo grau de indeterminação quanto ao respetivo conteúdo (Acórdão n.º 237/98) – que o tornam, de resto, especialmente sensível às circunstâncias de tempo e de lugar que definem o contexto em que é chamado a intervir –, leva postulada uma ideia de proteção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na atuação do Estado, o que implica um mínimo de certeza e segurança nos direitos das pessoas e nas suas expectativas juridica- mente criadas e, consequentemente, a confiança dos cidadãos e da comunidade na tutela jurídica (Acórdãos n. os  399/10, 396/11, 353/12, 187/13, 474/13, 602/13, 794/13 e 862/13). A lesão da tutela da confiança pressupõe, assim, num primeiro momento, que, ao editar a norma con- testada, o legislador ordinário haja intervindo em sentido contrário às legítimas expectativas que os particu- lares depositam na continuidade da ordem jurídica, na sua perduração estável ou na previsibilidade da sua mutação. Para que isso se verifique, é necessário, «em primeiro lugar, que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados “expectativas” de continuidade»; depois, que tais expectativas sejam «legítimas, justificadas e fundadas em boas razões; e, em terceiro lugar, que os privados hajam feito «planos de vida tendo em conta a perspetiva de continuidade do “comportamento estadual”» (Acórdão n.º 128/09, reconduzindo a testes a fórmula seguida no Acórdão n.º 287/90). 12. Importa, desde já, sublinhar que a proteção da confiança que aqui é invocada como parâmetro de aferição da constitucionalidade incide sobre uma norma que foi produzida pela Administração no exercí- cio do poder regulamentar e não sobre uma norma emanada do poder legislativo. Com efeito, as Portarias n.º 4182/2008 e n.º 611/2008 – de onde se extrai a norma impugnada – são regulamentos administrativos que revogam expressamente a norma administrativa contida no n.º 5 da Portaria n.º 1157/2004, que atribui aos militares integrados na MCSUB as remunerações adicionais e outras regalias estabelecidas no artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 56/81. E não é indiferente que a tutela da confiança seja oposta ao exercício do poder legislativo ou ao exercício do poder administrativo. É que a mobilização do princípio da proteção da confiança como limite à atuação administrativa convoca inevitavelmente a ponderação de princípios específicos que vinculam a Adminis- tração. Assim, o regulamento, enquanto uma das formas de exercício da atividade administrativa, encontra o seu fundamento direto no princípio da legalidade. Tal como resulta do artigo 266.º e do n.º 7 do artigo 112.º da CRP, a emissão de um regulamento há de ter por base, pelo menos, uma lei que defina a respetiva competência objetiva e subjetiva. Significa isto que os interesses públicos que à Administração incumbe realizar são filtrados pelo legis- lador, que, ao definir o fim e a competência do seu agir ou ao determinar, com maior ou menor densidade, a matéria a disciplinar, fixa os interesses públicos a prosseguir com a emanação do regulamento. O alcance do princípio da tutela de confiança enquanto limite da atuação administrativa está pois dependente do

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