TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

441 acórdão n.º 379/17 natureza. A remuneração do posto e a remuneração adicional podem estar teleologicamente orientadas como contrapartida retributiva de homólogas especificidades de prestação de trabalho. E se assim for, então pode haver a tendência para se cair numa situação de duplicação de remunerações. No preâmbulo da Portaria n.º 1157/2004 – onde se tenta descortinar a natureza retributiva da remune- ração adicional – também se refere que a Marinha dispõe dos «vastos conhecimentos técnicos» exigidos para o desempenho de funções na MCSUB. De facto, a Marinha dispõe, na categoria de oficiais da Armada, de postos e classes ( v. g. engenheiros navais e administração naval) cujo conteúdo funcional se diferencia pela natureza técnica especializada das respetivas atividades (artigos 225.º do Decreto-Lei n.º 236/99, de 25 de junho, então vigente). Ora, se a Marinha já dispõe de categorias profissionais que abarcam as competências exigidas pela MCSUB, pode não haver desencontro entre as funções efetivamente exercidas nessa missão e a qualificação/categorização profissional daqueles que as exercem. Sendo as funções da mesma natureza, pressupondo os mesmos conhecimentos técnicos e capacidade prática, então não pode ser aí que se deve encontrar a justificação para a remuneração adicional. É que, nesse caso, a qualidade do trabalho como contrapartida da retribuição já foi ponderada em sede de fixação das carreiras profissionais, das diversas cate- gorias e postos que as integram e das correspondentes tabelas salariais. Por outro lado, uma eventual situação de jus variandi – exercício transitório e excecional de funções de carreira diferente da detida – não poderia ser compensada através do tipo de suplementos remuneratórios para que remete o n.º 5 da Portaria. O sistema retributivo da função pública, em cujo âmbito se incluíam os suplementos, constava do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de junho, e do Decreto-Lei n.º 353-A/89, de 16 de outubro. Dos preceitos destes diplomas – aplicáveis às forças armadas, com as adaptações decorrentes dos seus estatutos (n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 184/89) – decorria que os suplementos obedeciam a um numerus clausus, de tal modo que os serviços e organismos administrativos só podiam proceder ao seu pagamento se ocorresse alguma das circunstâncias tipificadas no artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 184/89. Neste último artigo fazia-se uma distinção entre (i) suplementos destinados a remunerar particulari- dades específicas da prestação de trabalho e (ii) suplementos destinados a compensar despesas feitas por motivo de serviço. Nos primeiros, a enumeração era taxativa, encontrando-se o legislador impedido de criar outros que não se baseassem nas circunstâncias elencadas no n.º 1; nos segundos, a enumeração era meramente exemplificativa, em resultado da expressão “designadamente” utilizada no n.º 2, não estando o legislador impedido de fixar as condições de atribuição de outros suplementos, desde que se fundamentas- sem na compensação de despesas feitas por motivo de serviço e fosse respeitada a reserva de decreto-lei na fixação do regime e condições de atribuição – n.º 3 do Decreto-Lei n.º 184/89 e artigo 12.º do Decreto- -Lei n.º 353-A/89. Por isso, embora a Portaria n.º 1157/2004 não mencione a lei habilitadora da fixação da remuneração adicional – o que pode colocar problemas de validade, como se dá conta no voto de vencido do acórdão recorrido –, a Administração só podia atribuir acréscimos remuneratórios para efeito de compensar despesas efetuadas por motivo de serviço. É sabido que a atividade regulamentar da Administração visa sobretudo a pormenorização ou comple- mentarização de uma disciplina delineada a nível legislativo, e que as normas primárias sobre determinada matéria só podem ser construídas a partir de uma moldura (ou um programa) definida pelo legislador. Daí que o exercício do poder regulamentar – corporizado na emissão da Portaria – só poderia ser exercido se uma lei prévia autorizasse a criação do complemento remuneratório. Ora, essa lei existia, mas apenas autorizava a remuneração adicional (e demais regalias) prevista no n.º 5 da Portaria se ela representasse uma compensação ou reembolso das despesas que os militares são obrigados a efetuar em virtude da prestação de serviço no estrangeiro. Com efeito, a habilitação para a Administração criar um acréscimo remuneratório na situação visada por aquela Portaria encontra-se no Decreto n.º 42 211 de 14 de abril de 1959 – que contém as disposições legais relativas ao abono de ajudas de custo aos milita- res dos três ramos das forças armadas em missões não diplomáticas no estrangeiro – quando no artigo 8.º prescreve que «(A)s dúvidas e casos omissos serão resolvidos por despacho do Ministro da Defesa Nacional, obtida a concordância do Ministro das Finanças». A duração da missão, que exigia residência prolongada

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