TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
362 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL para impedir o exercício do direito de denúncia pelo senhorio”, aqui por violação do princípio do Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2.º da Constituição (cfr. Acórdãos n. os 259/98, 270/99 e 682/99). Na sequência da referida sucessão de julgamentos – que culminou na declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade da norma constante do artigo 107.º, n.º 1, alínea b), do RAU, com funda- mento em inconstitucionalidade orgânica (cfr. Acórdão n.º 97/00) −, foi publicado o Decreto-Lei n.º 329- B/2000, de 22 de dezembro, diploma que não só restaurou, agora em condições organicamente válidas, a norma anteriormente contida naquele preceito legal, como, apesar de ter mantido em 30 anos o período mínimo de permanência do arrendatário no locado suscetível de obstar à denúncia do contrato pelo senho- rio, lhe associou, como causa igualmente impeditiva do exercício daquele direito, a permanência por período mais curto, desde que previsto em lei anterior e decorrido na vigência desta. Com a entrada em vigor do NRAU, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, o pendor vincu- lístico que vinha caracterizando o regime jurídico dos contratos de arrendamento urbano para habitação foi em larga medida abandonado. Reintroduzida no Código Civil (cfr. artigo 3.º da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro), a disciplina jurídica do contrato de arrendamento urbano que integra o NRAU trouxe, como principal novidade, a eliminação do anterior princípio de renovação automática dos contratos de arrendamento de duração não determinada: de acordo com as novas regras consagradas no artigo 1011.º do Código Civil, ao senhorio passou a assistir o direito de denunciar o contrato, não apenas com fundamento na verificação de determinadas circunstâncias excecionais – em cujo âmbito continuou a incluir-se a necessidade do locado para habitação, própria ou de descendente em primeiro grau [(cfr. alínea a) ] −, mas ainda em termos potestativos e discricionários – isto é, independentemente da ocorrência de qualquer causa justificativa −, desde que observada na exigida comuni- cação ao arrendatário a antecedência mínima fixada na lei [(cfr. alínea c) ]. Tendo em vista o acautelamento dos vínculos locatícios preteritamente constituídos, o NRAU estabele- ceu, todavia, dois regimes transitórios para os contratos de arrendamento em vigor à data da sua publicação, distinguindo entre os contratos habitacionais celebrados na vigência do RAU (artigo 26.º da Lei n.º 6/2006) e os contratos com início antes dessa vigência (artigos 27.º a 29.º). Por força da remissão contida no artigo 28.º do NRAU, ambos os regimes contemplavam, porém, um conjunto de especificidades comuns, com especial destaque para as contempladas no n.º 4 do respetivo artigo 26.º Assim, tanto os contratos habitacionais celebrados na vigência do RAU como os contratos iniciados em momento anterior, para além de não poderem ser livremente denunciados pelo senhorio nos termos que passaram a ser consentidos pela alínea c) do artigo 1011.º do Código Civil [cfr. alínea c) do n.º 4 do artigo 26.º da Lei n.º 6/2006], tinham garantida a aplicação, em caso de denúncia com fundamento na necessidade do locado para habitação, própria ou de descendente em primeiro grau, de ambas as limitações a que aquele direito se encontrava sujeito nos termos do n.º 1 do artigo 107.º do RAU [cfr. alínea a) do n.º 4 do artigo 26.º da Lei n.º 6/2006]. Quer isto significar que, no âmbito daqueles contratos, a denúncia pelo senhorio não poderia operar tanto em face da circunstância prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 107.º do RAU — ter o arrendatário 65 ou mais anos de idade ou, independentemente desta, se encontrar na situação de reforma por invalidez absoluta, ou, não beneficiando de pensão de invalidez, sofrer de incapacidade total para o trabalho −, como perante a hipótese contemplada na respetiva alínea b) − manter-se o arrendatário no local arrendado há 30 ou mais anos, nessa qualidade ou por um período de tempo mais curto previsto em lei anterior e decorrido na vigência desta. O regime transitório contido no artigo 26.º do NRAU foi, entretanto, revisto pela Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto, em termos que se mantiveram aplicáveis tanto os contratos habitacionais celebrados na vigên- cia do RAU como os contratos iniciados antes da respetiva vigência (cfr. artigo 28.º). Justificada pelo propósito de “reforça[r] a negociação entre as partes e facilit[r] a transição dos referidos contratos para o novo regime, num curto espaço de tempo” [cfr. artigo 1.º, alínea b) , da Lei n.º 31/2012], tal
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