TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

350 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL crime tributário” constituía uma condição simultaneamente necessária e suficiente para que o administrador ou gerente pudesse ser chamado a responder solidariamente pela coima ou multa aplicada ao ente coletivo, não se exigindo para esse efeito a prática pelo mesmo de um qualquer ato, anterior ou posterior à aplicação da referida pena, que tivesse colocado tal ente na impossibilidade de satisfazer o pagamento da sanção pecu- niária em que fora condenado. Por isso, ainda que a obrigação solidária surgisse “qualificada formalmente como uma obrigação de natureza civil” – era essa a qualificação indiciada pela epígrafe do referido artigo 8.º −, “ela não deixa[va] de representar, na prática, uma consequência jurídica do ilícito penal que fo[ra] diretamente imputado à pessoa coletiva”: na ausência de quaisquer outros pressupostos ou requisitos, a “responsabilidade solidária, ainda que dependente de uma conduta dolosa do administrador ou gerente”, assentava “no próprio facto típico que é caracterizado como infração” . Assim, conforme ali se concluiu, “a imposição de uma responsabilidade solidária a terceiro para paga- mento de multas aplicadas à pessoa coletiva”, tal como admitida no  n.º 7 do artigo 8.º do RGIT, configurava “uma situação de transmissão da responsabilidade penal”, por efeito da qual o “obrigado solidário” passaria “a responder pelo cumprimento integral da sanção” respeitante “a uma outra pessoa jurídica, implicando a violação do princípio da pessoalidade das penas consignado no artigo 30.º, n.º 3, da Constituição”. 16. Atentando no mecanismo constante do n.º 5 do artigo 7.º do RGIT à luz da orientação extraível dos julgamentos acabados de referir, a questão que cumpre aqui resolver consiste, pois, em saber se, no seg- mento em que dispõe que “pela pena de multa ou coima aplicada a uma entidade sem personalidade jurídica, responde, na falta ou insuficiência do património comum, solidariamente, o património de cada um dos associados”, aquela norma autoriza ou impõe a transferência para estes da responsabilidade criminal àquela entidade atribuída ou, pelo contrário, é configurável um outro título, diferente deste, suscetível de justificar, fora do quadro daquela transmissão, que os associados sejam chamados a responder pelo pagamento da multa aplicada em caso de ausência ou insuficiência do património comum. Do ponto de vista da caracterização do mecanismo sob sindicância, a primeira nota a assinalar diz res- peito à respetiva inserção sistemática: trata-se de uma regra prevista no âmbito do artigo 7.º do RGIT – que, conforme indicado pela respetiva epígrafe, fixa o regime da responsabilidade das pessoas coletivas e equipara- das pelos crimes e contraordenações tributárias – e não no respetivo artigo 8.º − que trata, num plano formal- mente diferenciável, da responsabilidade civil pelas multas e coimas aplicadas (também) àquelas entidades. Embora tal circunstância não seja em si mesma decisiva – não tendo obstado, por isso, a que se tivesse identificado no regime anteriormente constante do n.º 7 do artigo 8.º do RGIT um mecanismo incompa- tível com o n.º 3 do artigo 30.º da Constituição −, ela é, no caso presente, elucidativamente indicativa de que, pelas razões que seguidamente se exporão, o n.º 5 do artigo 7.º consagra um verdadeiro instrumento de efetivação da responsabilidade penal atribuída ao ente coletivo sem personalidade jurídica. Quando comparado com a solução anteriormente constante do n.º 7 do artigo 8.º do RGIT, o regime consagrado no n.º 5 do respetivo artigo 7.º apresenta três notas distintivas essenciais. A primeira diz respeito ao título a que são chamados ao pagamento da sanção aplicada ao ente coletivo os terceiros onerados com tal obrigação: enquanto o n.º 7 do artigo 8.º do RGIT estabelecia uma responsa- bilidade solidária entre o ente coletivo e aqueles que tivessem colaborado dolosamente na prática de infração tributária – o que significava que o valor correspondente à pena de multa aplicada ao ente coletivo poderia ser exigido por inteiro a qualquer deles −, a responsabilidade que o n.º 5 do artigo 7.º do RGIT faz impedir sobre os associados do ente coletivo sem personalidade jurídica é subsidiária em relação à deste − ainda que solidariamente entre si, os associados apenas podem ser chamados ao pagamento da pena de multa em caso de inexistência ou insuficiência dos bens do seu devedor originário. A segunda relaciona-se com o pressuposto de tal chamamento: enquanto o regime anteriormente cons- tante do n.º 7 do artigo 8.º do RGTI baseava a responsabilidade dos sujeitos singulares chamados ao paga- mento da pena aplicada ao ente coletivo no facto de os mesmos terem “colabora[do] dolosamente na prática

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