TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

344 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL tanto criminal como contraordenacional que a tal entidade tiver sido atribuída, sendo certo que, considerada a natureza do procedimento sancionatório instaurado no processo-base, apenas naquele primeiro âmbito é possível sediar a recusa da sua aplicação pelo tribunal a quo. Em segundo lugar, tendo a instância recorrida fundamentado o juízo de inconstitucionalidade subja- cente à recusa de aplicação da norma constante do n.º 5 do artigo 7.º do RGIT na incompatibilidade da “responsabilidade subsidiária dos gerentes ou administradores de uma pessoa coletiva” pelo pagamento da pena de multa a esta aplicada com “o princípio (…) da intransmissibilidade da responsabilidade criminal”, consagrado no n.º 3 do artigo 30.º da Constituição, há que concluir que somente o último segmento daquela norma − e não também aquele que vincula o património comum a tal pagamento −, foi efetivamente afas- tado pelo tribunal a quo. Sob efeito desta dupla delimitação – imposta, conforme se viu, pelos próprios termos da decisão recor- rida −, deve entender-se que objeto o presente recurso é integrado pela norma constante do n.º 5 do artigo 7.º do RGIT, no segmento em que dispõe que, “pela pena de multa aplicada a uma entidade sem persona- lidade jurídica, responde, na falta ou insuficiência do património comum, solidariamente, o património de cada um dos associados”. É essa norma, portanto, que cumprirá confrontar seguidamente com a Constituição. B. Enquadramento 9. Conforme indicado pela respetiva epígrafe, o artigo 7.º do RGIT estabelece o regime jurídico da responsabilidade penal e contraordenacional das pessoas coletivas e equiparadas pelos ilícitos tributários tipificados na Lei n.º 15/2001, de 5 de junho. Tendo como antecedente legislativo imediato o artigo 7.º do Regime Jurídico das Infrações Fiscais não Aduaneiras (doravante, “RJIFNA”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de janeiro, tal regime baseia-se num princípio de responsabilização das “pessoas coletivas, sociedades, ainda que irregularmente constituídas e outras entidades fiscalmente equiparadas” pelas infrações criminais e contraordenacionais pre- vistas no RGIT, “quando cometidas pelos seus órgãos ou representantes, em seu nome e no seu interesse coletivo” (n.º 1). Responsabilizáveis pelos crimes e contraordenações previstos na Lei n.º 15/2001 são, assim, (i) as pes- soas coletivas, (ii) as sociedades, ainda que irregularmente constituídas, e (iii) as outras entidades fiscalmente equiparadas, às quais possa ser imputada, de acordo com o modelo de imputação definido na parte final do referido preceito, a prática de qualquer uma daquelas infrações. 10.1. De acordo com a orientação aceite na doutrina, integram o conceito de pessoas coletivas as orga- nizações constituídas por uma coletividade de pessoas ou por uma massa de bens, dirigidas à realização de interesses comuns ou coletivos, às quais a lei atribui personalidade jurídica, considerando-as centros autó- nomos de relações jurídicas e reconhecendo-lhes essa autonomia mesmo em relação aos seus membros ou às pessoas que atuam como seus órgãos (cfr. Carlos da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil , 4.ª edição por António Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto, Coimbra Editora, 2005, p. 269). A par das pessoas coletivas, também as sociedades, ainda que irregularmente constituídas, são criminal e contraordenacionalmente responsabilizáveis pelos ilícitos tributários cometidos pelos seus órgãos ou repre- sentantes, em seu nome e no seu interesse coletivo. 10.2. Pressupondo, na sua densificação, o recurso a normas de direito societário, o conceito de socie- dades irregulares – também designadas por “sociedades em formação” (cfr. Menezes Cordeiro, Manual de Direito das Sociedades , I, Coimbra, Almedina, 2007, pp. 467 e seguintes) ou “sociedades imperfeitas” (cfr. Pinto Furtado, Curso de Direito das Sociedades , Coimbra, Almedina, 2004, p. 209) – compreende, de acordo com o regime constante dos artigos 36.º a 40.º do Código das Sociedades Comerciais (doravante, “CSC”),

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