TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
338 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL artigo 30.º da Constituição encontra-se associada ao princípio da pessoalidade das penas, por força da qual se encontra constitucionalmente vedada ao legislador ordinário a edição de normas que auto- rizem ou imponham a transferência da responsabilidade penal atribuída a um sujeito para um outro, distinto daquele, independentemente de qual possa ser o título dessa atribuição ou o tipo de relação entre ambos para tal efeito requerida. IV – Por isso, sempre que em causa esteja a apreciação da validade constitucional de um qualquer regime de responsabilidade pelo pagamento do valor correspondente à pena de multa aplicada a um ente coletivo, o que importará verdadeiramente determinar no confronto com n.º 3 do artigo 30.º da Constituição é se se trata da consagração de um mecanismo de efetiva transferência ou transmissão da responsabilidade criminal àquele ente imputada para o sujeito onerado com tal pagamento ou, pelo contrário, é possível fundar num outro título, autónomo e independente daquela, a responsabilidade pelo pagamento que para este advirá, designadamente em caso de insuficiência patrimonial inviabili- zadora do cumprimento motu proprio da sanção pecuniária imposta. V – A essa luz, a questão que cumpre aqui resolver consiste em saber se, no segmento em que dispõe que “pela pena de multa ou coima aplicada a uma entidade sem personalidade jurídica, responde, na falta ou insuficiência do património comum, solidariamente, o património de cada um dos associados”, a norma sub iudicio autoriza ou impõe a transferência para estes da responsabilidade criminal àquela entidade atribuída ou, pelo contrário, é configurável um outro título, diferente deste, suscetível de justificar, fora do quadro daquela transmissão, que os associados sejam chamados a responder pelo pagamento da multa aplicada em caso de ausência ou insuficiência do património comum. VI – A circunstância da inserção sistemática da regra sob sindicância no âmbito do artigo 7.º do RGIT – que, conforme indicado pela respetiva epígrafe, fixa o regime da responsabilidade das pessoas cole- tivas e equiparadas pelos crimes e contraordenações tributárias – e não no respetivo artigo 8.º − que trata, num plano formalmente diferenciável, da responsabilidade civil pelas multas e coimas aplicadas (também) àquelas entidades –, embora não seja em si mesma decisiva é, no caso presente, elucidati- vamente indicativa de que o n.º 5 do artigo 7.º consagra um verdadeiro instrumento de efetivação da responsabilidade penal atribuída ao ente coletivo sem personalidade jurídica. VII – Quando comparado com a solução anteriormente constante do n.º 7 do artigo 8.º do RGIT, o regime consagrado no n.º 5 do respetivo artigo 7.º apresenta três elementos distintivos; porém, partilha com ele um aspeto estruturante e fundamental: ao contrário do que sucede no âmbito da hipótese con- templada no n.º 1 daquele artigo 8.º, nem a responsabilidade solidária dos intervenientes dolosos na infração anteriormente cominada no respetivo n.º 7, nem o chamamento subsidiário dos associados do ente coletivo sem personalidade jurídica ao pagamento da multa a este aplicada, constante do n.º 5 do artigo 7.º do RGIT, exige ou supõe da parte dos sujeitos físicos naqueles termos responsabilizáveis a prática de qualquer ato, anterior ou posterior à aplicação da pena de multa, que tenha colocado o ente coletivo na impossibilidade de satisfazer o respetivo pagamento. VIII– Deste ponto de vista, tal como se considerou suceder com a responsabilidade dos intervenientes dolo- sos na infração tributária prescrita no n.º 7 do artigo 8.º do RGIT, também aquela que, por força da previsão do n.º 5 do respetivo artigo 7.º, impende sobre os associados do ente coletivo sem personali- dade jurídica ocorre tout court, mediante a simples verificação da ausência ou insuficiência de patrimó- nio coletivo suscetível de assegurar o pagamento da pena de multa a tal ente aplicada, dispensando-se
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