TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
331 acórdão n.º 291/17 Em tal aresto, o Tribunal Constitucional julgou a norma não inconstitucional, aduzindo, no essencial, a seguinte fundamentação: «6. O que até agora se referiu leva-nos a centrar o problema no sentido e razoabilidade da imposição do ónus de suscitação da nulidade no prazo de dez dias a contar da data da sessão da audiência em que tiver ocorrido a omissão da documentação ou a deficiente documentação das declarações orais. Ou seja, a inconstitucionalidade da norma (por alegadamente contrariar o disposto nos artigos 20.º, n.º 4, e 32.º, n.º 7, da CRP) terá de decorrer do caráter arbitrário, excessivo ou desproporcionado de tal previsão. Ora, neste quadro referencial, deve entender-se que o complexo normativo aqui em causa, na interpretação que vem sendo indicada, não ultrapassa aqueles limites. Tratando-se de um ónus responsabilizante da parte com ele onerada, não se posiciona como arbitrário, ser- vindo óbvios interesses de economia processual, eficiência e, em geral, de racionalidade na utilização dos recursos dos tribunais. No caso de audiências que se prolonguem por inúmeras sessões e/ou digam respeito a vários sujeitos (arguidos e/ou ofendidos ou assistentes), esse interesse torna-se ainda mais premente, sério e atendível, perante a alternativa de invalidar uma, várias ou todas as sessões, em virtude de não ter sido verificada a regularidade das gravações. Por outro lado, não é arbitrária a mobilização dos sujeitos processuais potencialmente interessados num futuro recurso para realizar – melhor, ir realizando – tal controlo, visto que é na sua esfera que se projeta a utilidade da gravação. A norma em questão também não estabelece um ónus excessivo ou desproporcionado, exigindo um grau de disciplina e cuidado que reputamos de toleravelmente adequado à relevância do ato cuja regularidade se visa asse- gurar. A este propósito, deve sublinhar-se que, para a verificação da regularidade da gravação, não se exige uma completa análise crítica ou ponderação do respetivo conteúdo, mas apenas a constatação da disponibilidade e inte- gridade do registo. O prazo de dez dias não se mostra desajustado, por exíguo, a essa verificação, nem é de molde a dificultar o exercício de qualquer direito ou faculdade processual. Aliás, prova de que assim é (de que não se trata de um prazo intoleravelmente condicionador da faculdade de atuação da parte), obtém-se logo nas incidências do caso concreto: o recorrente, como se relata no item 1.1. supra, tendo recebido as gravações (as gravações de todo o julgamento) no dia 01/04/2011, logrou determinar as respetivas deficiências em 4/5 dias, invocando essa questão junto do Tribunal no dia 06/04/2011. Assim, e consequentemente, não pode afirmar-se que o ónus identificado inviabilize ou condicione substancialmente o direito ao recurso em matéria de facto ou qualquer outro de que o assistente possa ser titular para afirmação dos seus interesses no processo. Não se afigura relevante para apreciar a presente questão de constitucionalidade o argumento de que a verifica- ção das gravações deveria ser tarefa do Estado ou, genericamente, “dos tribunais”. Trata-se de uma ideia que pode nortear o legislador num ou noutro sentido, enquanto motivo a ponderar no traçado da política legislativa, mas, não traduzindo – como efetivamente não traduz – uma imposição da lei fundamental, desloca a discussão – con- cretamente a que se trava a respeito da atuação processual do ofendido – para o plano (exterior ao presente recurso) das melhores soluções legislativas e da boa interpretação da norma legal. Pelo contrário (reafirma-se), o que ora importa apurar é se a dita regra contraria algum princípio ou norma da Constituição. O que devemos concluir, em suma, perante as exigências constitucionais de que seja assegurado um processo equitativo, é que a norma segundo a qual a nulidade decorrente da falta ou deficiência da documentação da prova deve ser arguida no prazo de dez dias, a contar da data da sessão da audiência em que tiver ocorrido a omissão da documentação ou a deficiente documentação das declarações orais, se contém na margem de liberdade de confor- mação do legislador, por não impor aos sujeitos processuais – muito particularmente ao assistente – uma restrição arbitrária, excessiva ou desproporcionada. De resto, ainda que elevássemos o padrão de proteção do assistente em processo penal ao nível da proteção do arguido, sempre cumpriria indagar se a imposição daquele ónus implicaria um condicionamento inadmissível e injustificável das respetivas garantias, o que continuaria a merecer resposta negativa, pelas razões já explicitadas (v., a este propósito, o Acórdão n.º 208/03, designadamente o excerto transcrito no item 3.1. supra ).»
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