TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

325 acórdão n.º 291/17 do necessário suporte técnico, e a efetiva satisfação desse pedido pelo funcionário, nos termos do n.º 3, do artigo 101.º do Código de Processo Penal. 61. Ora, perante garantias constitucionais que se confrontam, deve o legislador ordinário solver o conflito através da criação de uma solução que otimize os princípios digladiantes, não limitando ou restringindo qualquer deles em detrimento de outro – ou outros –, de modo injustificado, desproporcional ou irrazoável. 62. Com tal desiderato, logrou o legislador ordinário, por meio da consagração do prazo de 10 dias a contar da data da sessão da audiência em que tiver ocorrido a omissão da documentação ou a deficiente documentação das declarações orais, para arguição da falta ou deficiência da gravação dos depoimentos prestados oralmente em audiência de julgamento, conciliar e otimizar os direitos constitucionais colidentes, garantindo aos arguidos o exer- cício dos seus direitos de defesa, designadamente o exercício do direito ao recurso, não descurando, ainda assim, o direito dos mesmos a um julgamento no mais curto prazo possível compatível com as garantias anteriormente asseguradas. 63. De jeito idêntico ao que observámos no cotejo com as garantias asseguradas pelo n.º 1 do artigo 32.º, da Constituição da República Portuguesa, também na conferência com o princípio constitucional do direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva não se revela com ele incompatível a solução legal cuja inconstitucionali- dade é aqui suscitada, e para cuja conceção o legislador ordinário é competente, uma vez que a mesma se demonstra adequada, necessária e proporcional. 64. Por último, afigurando-se-nos indiscutível – designadamente em julgamentos que se prolonguem no tempo – que a exigência de que a falta ou deficiência da gravação dos depoimentos prestados oralmente em audiência seja suscitada pelo arguido (ou por outro ator processual com legitimidade para tal), no prazo geral de 10 dias a contar da data da sessão em que tiver ocorrido a omissão da documentação ou a deficiente documentação das declarações orais (acrescido do período de tempo que mediar entre o requerimento da cópia da gravação, acompanhado do necessário suporte técnico, e a efetiva satisfação desse pedido) constitui um pesado ónus para o requerente e, con- sequentemente, um constrangimento das suas garantias de defesa e, indiretamente, do seu direito ao recurso, não é menos verdade que uma solução como a preconizada pelo ora recorrente, que postergasse para o final da audiência de julgamento – mais concretamente para a data da notificação da decisão final – o início do prazo de 10 dias para a suscitação da falta ou deficiência da gravação dos depoimentos orais, revelar-se-ia, principalmente nos casos de “julgamentos demorados que se prolonguem por múltiplas sessões”, suscetível de violar, grave e intensamente, o direito do arguido a “ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa”, proclamado no n.º 2, do artigo 32.º, da Constituição da República Portuguesa. 65. Esta conclusão foi, recentemente, corroborada e reforçada pela prolação, em 15 de março de 2017, do douto Acórdão n.º 118/17 (ainda não transitado em julgado), no qual o Tribunal Constitucional abraçou, no essencial, tese coincidente com a aqui sustentada, tendo decidido, a final, quanto a norma jurídica material e essen- cialmente igual à que se analisa nos presentes autos, que a mesma (a resultante da conjugação dos artigos 363.º, 364.º, n.º 1, e 105.º, n.º 1, do Código de Processo Penal) “na interpretação segundo a qual a nulidade prevista no artigo 363.º do CPP deve ser arguida perante o tribunal de 1.ª instância, em requerimento autónomo, no prazo geral de 10 dias a contar da data da sessão da audiência em que tiver ocorrido a omissão da documentação ou a deficiente documentação das declarações orais, sob pena de dever considerar-se sanada”, não é inconstitucional. 66. Sintetizando, diremos que a interpretação normativa que sustentou a douta decisão recorrida não se revela, para a prossecução do direito ao processo célere, desadequada, desnecessária ou desproporcionada e, consequen- temente, não viola o princípio constitucional do direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, como não viola, igualmente, as garantias de defesa do arguido proclamadas no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, entre as quais o direito constitucional ao recurso. 67. Em face do exposto, deverá o Tribunal Constitucional, em nossa opinião, julgar não inconstitucional a interpretação normativa do artigo 363.º do Código de Processo Penal, segundo a qual a falta ou deficiência da gravação dos depoimentos prestados oralmente em audiência de julgamento deve ser arguida perante o tribunal da 1.ª instância, em requerimento autónomo, no prazo geral de 10 dias, a contar da data da sessão da audiência em que tiver ocorrido a omissão da documentação ou a deficiente documentação das declarações orais, acrescido

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