TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
310 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL interpretava de um ou mais preceitos, é tal dimensão que deve ser considerada como uma norma autónoma” (Acórdão n.º 107/07, ponto 2). Ora, os elementos diferenciadores identificados revelam que o Tribunal se confrontou, nos dois acórdãos, com normas substancialmente distintas. A norma que prevê que a impugnação interposta de decisões da Autoridade da Concorrência que apliquem coima tem, em regra, efeito devolutivo, apenas lhe podendo ser atribuído efeito suspensivo quando a execução da decisão cause ao visado prejuízo considerável e este preste caução, não coincide, na sua substância, à norma que, atribuindo embora o mesmo efeito regra ao recurso (efeito devolutivo) e fazendo igualmente depender o efeito suspensivo da prestação de uma caução, o faz, todavia, independentemente da situa- ção económica do visado e definindo a caução como substitutiva da coima. Se a primeira convive ainda com a possibilidade de consideração da situação de indisponibilidade económica do visado, a segunda abstrai-se explici- tamente dessa consideração, desvalorizando totalmente esse elemento de facto como suscetível de poder relevar na decisão a proferir pelo juiz. 6. A diferença de objeto do julgamento identificada encontra também reflexo na fundamentação dos dois acórdãos. Com efeito, enquanto o Acórdão n.º 376/16 afasta expressamente do objeto de conhecimento do recurso a situação de um interessado que não disponha de meios económicos para prestar a caução imposta pelo artigo 84.º da Lei da Concorrência, por considerar que esta dimensão normativa não teve aplicação ao caso concreto (“por não ser essa a situação do caso e uma tal interpretação normativa não ter constituído ratio decidendi , mas um mero obiter dictum ” – cfr. ponto 2), o Acórdão n.º 674/16 refuta a exclusão desta dimensão normativa, integrando-a no julgamento empreendido (cfr. pontos 6, 23, 24 e 25). Por outro lado, enquanto o acórdão-fundamento admite a possibilidade de o tribunal fixar caução “pela forma e montante julgados adequados ao caso concreto”, o que considera ser uma “válvula de escape” que retira rigidez e automaticidade ao sistema, o acórdão recorrido analisa a interpretação normativa do artigo 84.º da Lei da Concor- rência assente numa ideia de automaticidade na sua aplicação que não deixa espaço para um juízo de dispensa ou adequação, atentos os circunstancialismos do caso concreto. 7. A diferença das dimensões normativas julgadas tem implicações necessárias no juízo de conformidade ou desconformidade constitucional empreendido em ambos os acórdãos, designadamente num juízo de inconstitu- cionalidade fundado também na violação do princípio da proporcionalidade. Não se pode, assim, concluir que se esteja perante a mesma norma que tenha sido objeto de decisões em sen- tido divergente pelos Acórdãos n.º 376/16 e n.º 674/16. Em face do exposto, não se verificando, na relação entre as duas decisões, o pressuposto para o recurso para o Plenário previsto no artigo 79.º-D, n.º 1, da LTC, consistente em o Tribunal ter julgado a questão de inconsti- tucionalidade em sentido divergente do anteriormente adotado quanto à mesma norma, não se admite o recurso interposto para o Plenário.» 4. Na sequência a recorrente reclamou daquele despacho, invocando, no essencial, os seguintes funda- mentos: «15. Existe clara divergência entre os acórdãos em causa. 16. No acórdão n.º 376/16 o TC analisa se a norma contida nos números 4 e 5, do artigo 84.º da Lei n.º 19/2012 – que faz depender a atribuição de efeito suspensivo à impugnação judicial das decisões finais con- denatórias da prestação de caução e da verificação de um prejuízo considerável para o impugnante em resultado da execução da decisão – viola os princípios da tutela jurisdicional efetiva (artigo 20.º da CRP), da presunção da inocência (artigo 32.º da CRP) e da proporcionalidade. 17. OTC emitiu um juízo de não inconstitucionalidade por considerar que a norma em causa não viola a CRP, desde logo porque não estando em causa o direito a impugnar judicialmente a decisão administrativa, a atribuição de efeito suspensivo não põe em causa a tutela jurisdicional efetiva. Antes se obriga a uma ponderação entre a
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