TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
303 acórdão n.º 271/17 tal norma, numa situação análoga àquela em que o Tribunal atua no âmbito da fiscalização abstrata da cons- titucionalidade. O que, em princípio, não se afigura nem desejável nem conveniente. Por outro lado, e porventura mais decisivamente, a referida norma, porque respeita a um tipo especial de mandado – uma garantia procedimental traduzida no mandado judicial para a entrada no domicílio de pessoa que não dê o seu consentimento, e no qual se desenvolvam atividades sujeitas a fiscalização por parte de funcionários municipais no âmbito do RJUE – exige uma consideração do domínio normativo – o Norm- bereich, que no caso se antevê como particularmente complexo atenta a tipologia de intervenções do muni- cípio justificativas da entrada dos funcionários municipais no domicílio (sobre a mesma, vide Dulce Lopes, Mandado, por quem?, cit., pp. 40-41) – e, por via da mesma, a articulação com outras normas que sobre o mesmo domínio incidam. Tomada apenas on its face, a norma do artigo 95.º, n.º 2, do RJUE assegura a reserva de juiz, que é, face à multiplicidade de tipos de intervenções urbanísticas que podem ser consideradas, a “garantia das garantias” a que prima facie se reporta o artigo 34.º, n.º 2, da Constituição. Inexiste, portanto, qualquer evidência de uma inconstitucionalidade material. III – Decisão Pelo exposto, decide-se: a) Não julgar inconstitucional a norma extraída do artigo 95.º, n.º 2, do Decreto Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro (RJUE), na redação dada pelo artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, que permite a realização de inspeções ao domicílio de qualquer pessoa, sem o seu con- sentimento, nos termos e para os efeitos do referido diploma, ainda que sem a dispensa de prévio mandado judicial; e, em consequência, b) Conceder provimento ao recurso, determinando-se a reformulação da decisão recorrida de harmo- nia com o precedente juízo de não inconstitucionalidade. Sem custas. Lisboa, 31 de maio de 2017. – Pedro Machete – Lino Rodrigues Ribeiro – Fernando Vaz Ventura – Cata- rina Sarmento e Castro (vencida nos termos da declaração de voto junta) – Manuel da Costa Andrade (vencido nos termos de declaração junta). DECLARAÇÃO DE VOTO Fiquei vencida, na medida em que me pronunciei no sentido da inconstitucionalidade da norma extraída do artigo 95.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro – que estabelece o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação –, na redação dada pelo artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, a qual permite a realização de inspeções ao domicílio de qualquer pessoa, sem o seu consentimento, nos termos e para os efeitos do referido diploma, ainda que sem a dispensa de prévio mandado judicial, por entender que viola o artigo 165.º, n.º 1, alínea b), da Constituição da República Portuguesa. Revela-se aqui pertinente recordar que a redação originária do artigo 95.º, n.º 2, do RJUE, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro (editado no uso da autorização atribuída ao Governo pela Lei n.º 110/99, de 3 de agosto), foi objeto de um juízo de inconstitucionalidade, no Acórdão n.º 195/16, com fundamento na violação da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República quanto a matéria de direitos, liberdades e garantias [artigo 165.º, n.º 1, alínea b), da Constituição]. Certo é que sobreveio nova lei de autorização ao Governo (Lei n.º 100/2015, de 19 de agosto), com o expresso intuito de se alterar, entre outros, “o n.º 3 do artigo 95.º do RJUE, no sentido de atribuir aos
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