TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
293 acórdão n.º 271/17 no âmbito do RJUE – matéria relevante nos termos da alínea b) do artigo 165.º, n.º 1, da mesma Lei Fundamental; com efeito, o que justifica a necessidade de emissão de tal mandado judicial é a prote- ção da inviolabilidade do domicílio, a que a Constituição reconhece a natureza de direito de liberdade sujeito ao regime dos direitos, liberdades e garantias. IX – Quanto à eventual violação de outros parâmetros constitucionais pela norma desaplicada pelo tribu- nal a quo, por um lado, verifica-se que a decisão recorrida se limitou a uma desaplicação da norma do artigo 95.º, n.º 2, do RJUE por razões estritamente orgânico-formais, pelo que, caso o Tribunal Cons- titucional procedesse agora a um cotejo da norma em causa com parâmetros constitucionais materiais, teria de ser ele a estabelecer direta e primariamente o sentido de tal norma, numa situação análoga àquela em que o Tribunal atua no âmbito da fiscalização abstrata da constitucionalidade, o que, em princípio, não se afigura nem desejável nem conveniente; por outro lado, a referida norma, porque respeita a um tipo especial de mandado exige uma consideração do domínio normativo e, por via da mesma, a articulação com outras normas que sobre o mesmo domínio incidam; tomada apenas on its face, a norma do artigo 95.º, n.º 2, do RJUE assegura a reserva de juiz, que é, face à multiplicidade de tipos de intervenções urbanísticas que podem ser consideradas, a “garantia das garantias” a que prima facie se reporta o artigo 34.º, n.º 2, da Constituição, inexistindo, portanto, qualquer evidência de uma inconstitucionalidade material. Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. O Presidente da Câmara Municipal de Ferreira do Zêzere, alegando terem sido detetadas obras irregulares, requereu em 5 de julho de 2016 junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, ao abrigo do disposto no artigo 95.º do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro (estabelece o Regime Jurídico de Urbanização e Edificação, adiante referido como “RJUE”), a emissão de mandado judicial para entrada no domicílio de A., tendo em vista a fiscalização das mencionadas obras. O requerido contestou tal pedido, suscitando, desde logo, e além do mais, a inconstitucionalidade orgânica do artigo 95.º, n.º 2, do RJUE. No despacho saneador de 17 de novembro de 2016, entendeu a Mma. Juíza dever começar por conhecer da alu- dida exceção perentória de inconstitucionalidade, atenta a recente publicação do Acórdão n.º 195/16 deste Tribunal (acessível, como os demais adiante citados, em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ ). E seguindo a jurisprudência de tal aresto, decidiu «julgar inconstitucional, por violação do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa, a norma, extraída do artigo 95.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de outubro (RJUE), que permite a realização de inspeções ao domicílio de qualquer pessoa, sem o seu consentimento, nos termos e para os efeitos do referido diploma, ainda que sem a dispensa de prévio mandado judicial» (fls. 96). Notificado desta decisão, o Ministério Público interpôs recurso de constitucionalidade, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea a) , da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (“LTC”). 2. Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal, foi determinada a produção de alegações (fls. 124). Nesse despacho o relator alertou para a circunstância de o artigo 95.º do RJUE aplicável à situação dos autos – daí a competência para a decisão recorrida pertencer a um tribunal administrativo e fiscal como é o
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