TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

273 acórdão n.º 267/17 E que portanto, e necessariamente, a parte 2 do novo n.º 21 do artigo 88.º do CIRC tem caráter inovatório (con- tracorrente, no caso contra a inserção da coleta primária da tributação autónoma na coleta do IRC). N) Por todas estas razões, algumas das quais por si sós suficientes, crê-se, a recorrida julga ter podido demonstrar que não é materialmente interpretativa a exclusão das deduções à coleta da tributação autónoma constante da segunda parte do novo n.º 21 do artigo 88.º do Código do IRC, introduzida pela LOE 2016. O) Mas mesmo que não houvesse certeza a propósito da ausência de caráter interpretativo na nova norma, aten- to o papel garantístico, com dignidade constitucional, da proibição de retroatividade da lei fiscal, a dúvida razoável é suficiente: no mínimo, transfere o ónus (se é que não esteve Iá sempre, atentas as regras gerais do ónus da prova) para quem clama pela natureza interpretativa de uma lei fiscal e com isso pretenda aplicá-la retroativamente sem a oposição da norma constitucional que o proíbe, de mostrar (anulando a dúvida razoá- vel) que é essa realmente, em substância, para lá da mera proclamação, a sua natureza. P) Antes de prosseguir, e dando um passo atrás, refira-se ainda que, como se demonstrou supra, uma norma como a introduzida pela LOE 2016 (o novo n.º 21 do artigo 88.º do CIRC), que impede haja deduções à coleta sobre a coleta da tributação autónoma em IRC, é um dos tipos de norma (entre muitos outros, confor- me supra exemplificado) que interfere com o quantum do imposto a pagar por referência ao facto tributário/ exercício fiscal em concreto em causa. Pelo que, provocando aumento do imposto a pagar, como sucede, está sujeita à proibição de retroatividade prevista no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição. Q) No caso concreto da decisão arbitral recorrida aqui em causa, a imposição da nova norma traduz-se num agravamento do imposto final a pagar a título de tributação autónoma no exercício de 2012, no montante de € 13 901,43, conforme quantificado nos artigos 13.º e segs. do pedido de pronúncia arbitral (junto à cópia digital do processo arbitral). R) Não é o PEC, e sua eventual recuperação mais tarde ao longo dos anos, que aqui estão em causa, mas, antes, o montante final da tributação autónoma a pagar em cada exercício fiscal/facto tributário agregado por exercício, montante final esse que aumenta em razão da eliminação (com pretensão retroativa) de deduções automáticas à coleta da tributação autónoma (deduções quer de PEC, quer de benefícios fiscais). S) Em suma, o que a recorrente AT pretende obter neste recurso é uma declaração de não desconformidade à Constituição de um aumento de imposto por força de norma que, com caráter retroativo, eliminou as dedu- ções à coleta da tributação autónoma em IRC, entre as quais se contam a dedução de PEC. […]. T) Prosseguindo, o que se relatou atrás nestas conclusões é sobretudo relevante para quem interprete o artigo 103.º, n.º 3, da Constituição, como excluindo do seu campo de aplicação leis fiscais materialmente (autenti- camente) interpretativas, e nessa linha tente aferir se uma lei é ou não autenticamente interpretativa, elegendo para isso os critérios que repute de adequados (operação prévia em si mesma atreita a múltiplas opiniões e incertezas). U) A decisão arbitral recorrida, pela sua parte e na esteira de outras que a precederam, entendeu que sem a interferência da LOE 2016 a interpretação da lei em vigor (existente) à data dos factos (2012) era a de que as deduções à coleta do IRC também se aplicam à coleta da tributação autónoma em IRC. É esta, pois, a interpretação que tem da lei o árbitro no exercício da função de julgar com isenção e imparcialidade o que diz a lei em vigor à data dos factos. Função de julgar que, acrescenta-se, é poder soberano que no seu exercício não pode nem deve ser condicionado pelos outros poderes soberanos. V) E numa segunda fase da análise da questão que lhe foi submetida a decisão arbitral recorrida rejeitou que a LOE 2016 lhe ditasse como deveria ser julgada/interpretada a lei em vigor à data dos factos. Raciocinando, pensa-se que bem, que onde a Lei Fundamental proíbe que o legislador altere o passado normativo, não lhe é constitucionalmente admitido que o altere ditando à função soberana de julgar como deve ser entendido esse passado normativo. W) Para a recorrida que tem de ser assim é uma evidência. De outro modo, lá diz o adágio, deixar-se-á, onde haja atrevimento bastante, que entre pela janela aquilo a que se fechou a porta. […]

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