TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

255 acórdão n.º 260/17 um injustificado agravamento da posição processual da parte. Como referemTiago Serrão e Marco Caldeira, «(s) é a existência de outros meios adicionais de garantia que impede a interposição imediata de recurso para as instâncias superiores, bem se pode dizer que a “generosidade” do legislador tem como consequência, a final, prejudicar os interessados – de facto, para estes, o cenário preferível seria que o artigo 27.º, n.º 2, do CPTA não existisse (…), na medida que surge como um mero obstáculo ao acesso à jurisdição superior» (cfr. “As reclamações para a conferência na jurisprudência administrativa: análise critica”, in O Direito , ano 145.º 2013, Tomo III, p. 653). 10. Na conformação das regras próprias do processo administrativo não está o legislador ordinário sujeito a uma vinculação constitucional tão intensa quanto a que se verifica a propósito da conformação das regras de processo penal. O Tribunal Constitucional reconhece e declara que a Constituição não impõe à ordem jurídica infraconstitucional um certo modelo concreto de processo, deixando à liberdade de confor- mação legislativa uma ampla margem de apreciação na definição da tramitação do processo, designadamente no que se refere aos requisitos de forma dos atos das partes, aos ónus processuais que sobre estes incidem e às cominações que resultem da inobservância das regras processuais (Acórdãos n. os 335/95, 508/02, 20/10, 186/10 e 629/13). Todavia, isso não significa que o legislador ordinário detenha uma total liberdade na concreta modela- ção do processo, como se fosse este um campo vazio de vinculações jurídico-constitucionais. É ponto assente que esta matéria não é imune aos princípios constitucionais e que os regimes adjetivos deverão mostrar-se funcionalmente adequados aos fins do processo, de modo a não traduzirem imposições sem sentido útil ou razoável, e não poderão impossibilitar ou dificultar de modo excessivo a atuação processual das partes, nem estabelecer consequências ou preclusões que sejam desproporcionadas em relação à gravidade da falta que é imputada. O Tribunal Constitucional tem dito que as normas processuais, como decorrência do princípio do processo equitativo, não podem impossibilitar ou dificultar de modo excessivo a atuação processual das partes, nem estabelecer consequências ou preclusões que sejam desproporcionadas em relação à gravidade da falta que é imputada (Acórdãos n. os 468/01 e 260/02). Nesse sentido, no Acórdão n.º 620/13 reitera-se que «(A)pesar de vigorar, na definição da tramitação do processo civil, uma ampla discricionariedade legislativa que permite ao legislador ordinário, por razões de conveniência, oportunidade e celeridade, fazer incidir ónus processuais sobre as partes e prever quais as cominações ou preclusões que resultam do seu incumprimento, isso não significa que as soluções adotadas sejam imunes a um controle de constitucionalidade que verifique, nomeadamente, se esses ónus são funcio- nalmente adequados aos fins do processo, ou se as cominações ou preclusões que decorram do seu incum- primento se revelam totalmente desproporcionadas perante a gravidade e relevância da falta, ou ainda, se de uma forma inovatória e surpreendente, face ao texto legal em vigor, são impostas às partes exigências formais que elas não podiam razoavelmente antecipar, sendo o desculpável incumprimento sancionado em termos irremediáveis e definitivos». Dentro dessa mesma linha de entendimento, o Tribunal considera que não pode deixar de ponderar, na apreciação da questão de constitucionalidade, e para aferir da previsibilidade da interpretação normativa adotada, as orientações jurisprudenciais que são seguidas, de forma pacífica, maioritária ou suficientemente sedimentada, quanto aos textos legais que devam ser aplicados (Acórdão n.º 413/02). De modo que nada obsta a que se tenha em devida consideração como fatores de ponderação aplicáveis à análise dos parâmetros de constitucionalidade, independentemente de integrarem o conteúdo normativo do recurso, a prática juris- prudencial que reiteradamente foi seguida durante vários anos quanto à admissão de recurso jurisdicional de decisões proferidas pelo relator em primeira instância. 11. Como se referiu, a interpretação impugnada criou um obstáculo processual à interposição de recurso jurisdicional direto de uma sentença de mérito proferida em primeira instância. A imposição do ónus de

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