TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
253 acórdão n.º 260/17 destes casos não é idêntico: há lugar a recurso para o tribunal superior ou a reclamação para a conferência, consoante o órgão judiciário que tenha intervindo e a qualidade em que tenha intervindo. E, desse modo, introduz-se, desde logo, um maior grau de dúvida quanto à definição do órgão judicial interveniente face às diferentes regras de competência, e um estado de incerteza objetiva quanto ao meio de reação, o qual se acentua quando o relator intervém fora do contexto processual que se encontra estritamente delimitado pelo artigo 27.º, n.º 1, alínea i) , do CPTA e, extravasando a competência do órgão colegial, pro- fere de decisão de mérito que se não confina a questão simples. Em segundo lugar, nas situações em que o recurso se baseia em fundamentos absolutos, isto é, em funda- mentos que tornam o recurso admissível independentemente dos valores da causa e da sucumbência, como é o caso da incompetência absoluta do tribunal [artigo 678.º, n.º 2, do CPC a que corresponde o artigo 629.º, n.º 2, alínea b) , do Novo CPC e artigo 142.º, n.º 3, do CPTA], acresce um outro fator de incerteza quanto ao meio de reação às decisões tomadas em juiz singular. Na eventualidade de o relator, em violação das regras de competência definidas para o juiz singular, avocar o poder decisório fora do condicionalismo previsto no artigo 27.º, n.º 1, alínea i) , do CPTA, o vício de preterição do tribunal coletivo deve ser invocado no recurso e não na reclamação, visto que o controlo da decisão impugnada não pode ser levado a efeito através de um meio de reação a apresentar perante um dos órgãos judiciários cuja competência é questionada. Num tal caso, em que o juiz invoca expressamente a alínea i) do n.º 1 do artigo 27.º do CPTA (ou nada diz), sem averiguar, fundamentar e demonstrar, ainda que sucintamente, os requisitos que legitimam essa opção, designadamente, que “ questão a decidir é simples” ou que a “pretensão é manifestamente infundada”, recai sobre a parte desfavorecida o ónus de perceber se tais requisitos estão ou não concretamente preenchi- dos, de modo a decidir se pretende ou não invocar a nulidade da sentença por “incompetência funcional”. Ora, este encargo é suscetível de induzir em erro as partes quanto ao meio processualmente adequado de reação: se entender que estão preenchidos os requisitos previstos no artigo 27.º, n.º 1, alínea i) , do CPTA, deve reclamar para a conferência; mas se considerar que a questão é complexa e que se decidiu em formação singular fora dos casos em que a lei o admite, deve invocar a incompetência do juiz singular em recurso jurisdicional. Do ponto de vista dos interesses processuais das partes, não é indiferente que seja afastada a intervenção do órgão judicial próprio que era suposto possuir as melhores condições para o julgamento do caso e garantir uma melhor qualidade de decisão. A atribuição da competência para o julgamento a um órgão colegial cons- titui uma opção justificada por razões de política legislativa (cfr. Mário Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo, Coimbra, 2010, p. 403), que visa conferir maior ponderação e objetividade ao julgamento nos caos em que estejam em causa processos que envolvam órgãos superiores da Administração Pública, ou que, em função do valor da causa, possam revestir de maior complexidade. Por isso, quando o juiz de primeira instância a quem tenha sido distribuído o processo decide intervir em substituição da formação de três juízes, não só deve indicar a norma habilitante, como explicitar funda- mentadamente, sob pena de induzir em erro as partes, a qualidade e os poderes em que intervém. A mera referência ao artigo 27.º, n.º 1, alínea i) , do CPTA é insuficiente porque permitiria ao juiz do processo afeiçoar os meios de reação à decisão do tribunal a quo. Na decisão em formação singular de uma questão complexa, bastava-lhe invocar ilegalmente aquele preceito para que logo se impusesse a reclamação para a conferência como condição prévia e necessária à interposição de recurso jurisdicional, sem que haja qualquer justificação material para se reduzir para um terço o prazo de impugnação da parte vencida. Em terceiro lugar, a orientação jurisprudencial contida no acórdão de uniformização n.º 3/12 não se compatibiliza com as normas que preveem o recurso jurisdicional de decisões interlocutórias proferidas em primeira instância. Como acima se referiu, foi por razões de celeridade que o legislador optou, no n.º 5 do artigo 142.º do CPTA, pela interposição de um recurso único, em que o recorrente impugna, não apenas a decisão final desfavorável, como todas as decisões interlocutórias que, caso sejam revogadas ou alteradas pelo tribunal superior, poderão influenciar o resultado final. Mas se fosse de admitir a reclamação para a
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