TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
25 acórdão n.º 244/17 em sede das garantias de processo penal, bem como, quanto ao primeiro segmento da norma, do princípio da ina- movibilidade dos juízes, nos termos expostos – é válido, justamente e conforme inicialmente antecipei, em relação às causas em matéria criminal. 39.º Não considero, todavia, que as conclusões sejam diferentes se o exercício da competência definida na citada norma da LOSJ disser antes respeito a causas do foro civil, já que também em sede de processo civil é similarmente aplicável a garantia de que nenhuma causa será apreciada por juiz ou tribunal designado arbitrária ou discriciona- riamente, i.e., segundo critérios casuísticos e, portanto, discriminatórios. 40.º Isto, seja por força do princípio do juiz natural, qua tale – ou, na eventualidade de se entender que este é um princípio constitucional específico do processo penal –, seja por força do direito a um processo equitativo, direito fundamental cujo âmbito de proteção abrange o direito de toda a pessoa a que uma causa em que intervenha seja apreciada por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei. 41.º Trilha-se, em seguida, o caminho que permite sustentar tais pontos de vista, no que especificamente tange à relevância, enquanto parâmetro de controlo na situação vertente, do princípio do juiz natural ou do direito a um processo equitativo consoante esteja em causa matéria criminal ou matéria civil, mantendo-se válidas, mutatis mutandis , as demais considerações já tecidas a respeito da incidência do princípio da inamovibilidade dos juízes. 42.º Destarte e antes de mais, conforme ficou evidenciado, nomeadamente, no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 82/14, compreende-se que o legislador constituinte tenha optado por consagrar o princípio do juiz natural especificamente na esfera das garantias de processo penal, «uma vez que a teleologia do juiz natural se associa à ideia de “impedir que motivações de ordem política ou análoga – aquilo em suma, que compreensivamente se pode designar pela raison d’État – conduzam a um tratamento jurisdicional discriminatório e, por isso mesmo, incompatível com o princípio do Estado de direito (cfr. Figueiredo Dias, ob. cit., p. 84)», conforme se escreve no mencionado aresto. 43.º Sem embargo, aludindo-se no mesmo Acórdão a um entendimento em torno do «princípio do juiz natural como dimensão resultante do princípio geral da independência que vale para toda e qualquer instância judicial, independentemente da matéria em causa – nos termos do artigo 203.º da Constituição», logo se acrescenta, nesse cenário, que «o seu alcance não tem uma abrangência mais vasta do que a exigência do respeito pelo “juiz legal” que o legislador constituinte optou por consagrar especificamente no campo das garantias de defesa em matéria penal». 44.º Vale por dizer: aceitando-se, à luz do que antecede – e até porque se trata de dimensão intrinsecamente ligada à própria ideia de due process –, que o respeito pelo princípio do juiz natural se impõe enquanto tal nas demais instân- cias judiciais, com similar incidência com que releva no âmbito criminal (a saber, «designação e pré-determinação do juiz (e tribunal) competente de harmonia com critérios legais, gerais e abstratos, aprovados e em vigor à data da prática dos factos», na formulação que o Tribunal Constitucional verteu no citado Acórdão n.º 82/14), a norma constante da alínea f ) , do n.º 4, do artigo 94.º da LOSJ é inconstitucional por desconformidade com as exigências constitucionais do referido princípio, também na sua aplicação enquanto princípio material do processo civil, pelas razões que já anteriormente deixei expressas.
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