TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

246 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL julgamento. Até à audiência de discussão e julgamento o processo corre perante o juiz ou tribunal singular, passando a partir desse momento a correr perante o tribunal coletivo, em relação à matéria de facto e/ou matéria de direito (artigo 40.º, n. os  2 e 3, do ETAF). De modo que nestes tribunais, até à fase de discussão e julgamento, o juiz a quem é distribuído o processo detém todos os poderes processuais na respetiva instância. Por isso mesmo, não se justifica a existência de um preceito de repartição de funções entre o juiz (singular) e o tribunal coletivo. O mesmo se passa com a aplicação do n.º 2 do artigo 27.º do CPTA aos tribunais de primeira instância. As funções que a reclamação para conferência cumpre nos tribunais superiores não podem ser realizadas nos mesmos termos quando tem por objeto despachos do juiz nos tribunais de primeira instância. Nos tri- bunais superiores, dos despachos do relator que não sejam de mero expediente, há sempre reclamação para a conferência, ainda que o processo esteja compreendido dentro da alçada do tribunal. A reclamação para a conferência é independente do valor da ação e por isso não está dependente de haver ou não recurso do acórdão da conferência. Nos casos em que não há recurso dos acórdãos da conferência, por de tratar de causa de valor inferior ao da alçada, a denegação da conferência deixaria as partes numa aceitação forçada de uma decisão singular quando é a colegialidade que enforma o conhecimento do objeto do processo. Assim, nesse caso, a reclamação para a conferência destina-se apenas garantir a decisão seja tomada pelo verdadeiro titular do poder jurisdicional, substituindo a opinião singular do relator pela decisão coletiva do tribunal e não a provocar um acórdão do qual se possa recorrer. Já nos tribunais de primeira instância, se a causa tiver valor inferior ao da alçada, nem há recurso nem reclamação para a conferência, porque nesse caso não intervém o tribunal coletivo. Por isso, a admitir-se reclamação para a conferência, ela estaria sempre dependente do valor da ação, cumprindo apenas a função de provocar a prolação de uma decisão recorrível, bem menos do que lhe incumbe realizar nos tribunais superiores. Por outro lado, tendo em conta o sistema de impugnação dos atos jurisdicionais instituído pela CPTA, não é fácil encontrar despachos proferidos num processo tramitado em tribunal de primeira instância susce- tíveis de reclamação para a conferência. Desde logo, os despachos interlocutórios, aqueles que são proferidos no decurso da instância e que não conduzem à sua extinção, apenas são impugnáveis se e quando for interposto recurso da decisão final (artigo 142.º, n.º 5, do CPTA). Como referem Mário Aroso de Almeida e Carlos Fernandes Cadilha, nestes casos, «o legislador terá optado, por razões de celeridade processual, pela interposição de um recurso único, em que o recorrente impugna, não apenas a decisão final desfavorável, como todas as decisões interlocutórias que, caso sejam revogadas ou alteradas pelo tribunal superior, poderão influenciar o resultado final» ( Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2.ª edição, Almedina, p. 816). Portanto, sendo a impug- nação dos despachos interlocutórios incorporada no recurso da decisão final, como se existisse um só recurso, fica afastada a possibilidade de sucessivas reclamações para a conferência desses despachos. É que não se pode confundir recursos de decisões interlocutórias com impugnações interlocutórias, como seria o caso da recla- mação para a conferência daquelas decisões. Depois, também não se encontra racionalidade na imposição da reclamação para a conferência dos despachos do juiz do processo em tribunal de primeira instância que, sem se pronunciarem sobe o mérito, põem termo à causa. Nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 142.º do CPTA, essas decisões são sempre recorríveis, seja qual for o valor da causa. Ora, não se encontra coerência jurídico-sistemática em se impor o ónus da reclamação para a conferência nas ações de valor superior à alçada e de se admitir o recurso direto nas ações de valor inferior. Nos tribunais superiores, em que não há recurso das decisões do relator, incluindo as de forma, a reclamação para a conferência justifica-se por ser o meio processual necessário a provocar uma decisão de que se possa recorrer, mesmo que a causa seja de valor inferior à alçada. Mas nos tribunais de primeira instância, em que as decisões do juiz do processo são diretamente recorríveis [alínea a) do artigo 37.º do ETAF], não se justifica a imposição de um meio impugnatório destinado a provocar a abertura do recurso jurisdicional. De outro modo, contrariamente ao que prescreve a lei processual, as decisões relativas

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