TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

244 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Nestas situações excecionais, cujo conhecimento em primeiro grau de jurisdição está reservado a tribu- nais superiores, continua a justificar-se a necessidade de marcar nitidamente as funções do tribunal coletivo, que é quem tem o poder jurisdicional para decidir o processo, e do juiz a quem o processo é distribuído – o relator –, que funciona como uma emanação do colégio constituído pelo conjunto de três juízes. Se o poder jurisdicional pertence a um tribunal coletivo, um dos juízes que o compõem deve ser incumbido de lavrar os despachos necessários ao andamento do processo. Daí a necessidade de um preceito que defina a competên- cia do juiz para instruir o processo e elaborar o projeto de decisão para o seu julgamento em coletivo. Ora, o artigo 27.º do CPTA, ao definir os poderes que o relator pode exercer singularmente, contém as disposições que satisfazem essa necessidade. Já em relação aos tribunais que funcionem com juiz singular não é necessário uma norma específica a definir as funções do juiz, porque é ele quem detém isoladamente todos os poderes processuais na respetiva instância.  Por outro lado, o artigo 27.º só encontra justificação quando reportado aos processos tramitados em pri- meira instância e não aos recursos jurisdicionais, uma vez que o CPTA prevê que a tramitação destes se rege pelas disposições previstas no Título VI e pelo disposto na lei processual civil. Assim, os poderes do relator nos recursos das decisões judiciais estão definidos nos artigos 140.º a 156.º do CPTA e, com as necessárias adaptações, no artigo 652.º do Código de Processo Civil (CPC), para que expressamente remete o artigo 140.º do CPTA. Por comparação com o artigo 9.º da LPTA, o artigo 27.º apresenta duas novidades: (i) a alínea h) , que confere ao relator o poder de adotar providências cautelares, ou submetê-las à apreciação da conferência, quando considere justificado; (ii) e a alínea i) , que atribui ao relator o poder de proferir decisão, quando entenda que a questão a decidir é simples, designadamente por já ter sido judicialmente apreciada de modo uniforme e reiterado, ou que a pretensão é manifestamente infundada. O primeiro poder resulta da competência dos tribunais superiores para adotar providências cautelares relativas a processos da sua competência [artigo 24.º, n.º 1, alínea c), e 37.º, alínea d) , do ETAF], apenas sendo aplicável nesses tribunais, uma vez que nos tribunais de primeira instância as providências cautelares são tramitadas e julgadas em juiz singular. O poder de decisão sumária sobre o objeto do processo inspirou-se no artigo 705.º do CPC, segundo a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de dezembro, para a apreciação liminar dos recursos jurisdicionais em processo civil. 4. A competência do relator para despachar os termos do processo e para, verificados certos pressu- postos, julgar, singular e liminarmente, o objeto do processo, não põe em causa a garantia da proteção jurisdicional efetiva das partes. Tal como já dispunha no n.º 2 do artigo 9.º da LPTA, o n.º 2 do artigo 27.º do CPTA prevê um meio processual destinado a assegurar que o controlo e o julgamento do processo seja efetuado, em última instância, pelo tribunal coletivo e não por um dos seus juízes: a chamada reclamação para a conferência. De facto, nos tribunais superiores não se pode interpor recurso das decisões do relator, pois este não é o tribunal. O tribunal tem natureza colegial, em cujas decisões intervêm, em regra, três juízes, que consti- tuem a conferência. Nos tribunais superiores o poder jurisdicional reside no órgão colegial e por isso só das decisões desse órgão se pode recorrer. Daí que o meio normal de reação contra os despachos do relator seja a reclamação para a conferência, a fim de obter que a decisão final provenha do verdadeiro titular do poder jurisdicional. A reclamação para a conferência cumpre assim um duplo objetivo: (i) substituir a decisão singular do relator pela decisão coletiva do tribunal; (ii) provocar a emissão de decisão suscetível de recurso jurisdicional. No STA e nos TCA o julgamento compete ao relator e a dois juízes, sendo as decisões tomadas em conferência (artigos 17.º e 35.º do ETAF). De modo que só a manifestação de vontade dos três juízes que compõem o tribunal coletivo pode exprimir a decisão final do tribunal. Os despachos do relator, que não sejam de mero expediente, têm sempre caráter provisório, uma vez que estão sujeitos a ser modificados pela conferência. Se a parte entender que o despacho é ofensivo da lei, pode reclamar para a conferência, a fim

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