TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

239 acórdão n.º 260/17 A solução a que corresponde a interpretação normativa em causa é facilmente encontrada através da qualificação da norma constante do artigo 27.º, n.º 2, do CPTA, como especial, relativamente à norma geral constante do artigo 142.º, n.º 1, do mesmo diploma, e portanto, especificamente aplicável nas situações em que as decisões, mesmo relativas ao mérito da causa, são proferidas pelo juiz relator, do mesmo modo que tal solução não é incompatível com as impugnações deduzidas com base em fundamentos absolutos, uma vez que a reclamação para o tribunal coletivo não é impeditiva da posterior possibilidade de interposição de recurso para um tribunal hierarquicamente superior. Acresce, relativamente a esta segunda “dificuldade interpretativa”, realçada pela decisão recorrida, que a mesma respeita a um segmento específico do modo de impugnação destas decisões, que apenas a ele diz respeito, não se encontrando o mesmo individualizado no conteúdo interpretativo sob recurso. Quanto à ausência de suficiente explicitação da fundamentação do uso da competência do relator pre- vista no artigo 27.º, n.º 1, alínea i) , do CPTA, em resultado da decisão ser proferida com base numa mera invocação dos poderes conferidos por essa disposição, tal circunstância em nada interfere com a maior ou menor previsibilidade da sua impugnação ter de utilizar como meio processual a reclamação. Na verdade, se a simples alusão pela decisão que esta é proferida ao abrigo da competência prevista no artigo 27.º, n.º 1, alínea i) , do CPTA, é útil na sua sinalização, alertando os destinatários para o tipo de decisão que lhes é dirigida, já a explicitação do preenchimento dos pressupostos que permitem a sua utilização nada acrescenta ao conhecimento pelas partes do meio processual que devem fazer uso para a impugnarem. O que é deter- minante para que o meio adequado de impugnação seja a reclamação prevista no n.º 2 do artigo 27.º do CPTA, é que a decisão formalmente se insira na previsão da alínea i) do n.º 1 do artigo 27.º do CPTA – uma decisão proferida pelo juiz relator avocando a competência do órgão colegial que integra. Se estavam ou não reunidos os pressupostos que permitiam a utilização deste tipo de decisão já é uma questão que respeita à sua regularidade processual, não sendo um problema cuja solução determine o modo de reação a essa decisão. Esse meio será sempre a dedução de uma reclamação, a qual poderá ter precisamente como fundamento a circunstância de não estar preenchido nenhum dos pressupostos que permitiam a avocação pelo relator da competência atribuída ao órgão colegial. Daí que a falta de explicitação das razões que permitiram ao relator proferir decisão singular não seja um fator criador de incerteza sobre qual o meio processual que as partes devem utilizar para impugnar aquela decisão. Há ainda a notar que, se é verdade que o menor prazo para deduzir a reclamação, relativamente ao que é concedido para a interposição de recurso, faz perigar a impugnabilidade da respetiva decisão em situações em que se gera uma incerteza sobre a necessidade de utilizar o primeiro daqueles meios impugnatórios, a consequência da utilização do recurso para além do prazo concedido para reclamar não é necessariamente a perda do direito de impugnar, consequência que não é assumida pela interpretação normativa  sub iudicio , sendo possível, numa linha interpretativa, convolar o meio utilizado para o meio devido (vide, neste sentido, Armindo Ribeiro Mendes, em Cadernos de Justiça Administrativa , n.º 97, pp. 33-36). Não se contando entre as competências do Tribunal Constitucional a fiscalização do modo como deter- minada norma foi aplicada no caso concreto e não existindo no conteúdo normativo impugnado fatores que prejudiquem seriamente a previsibilidade pelos destinatários do meio de impugnação que devem utilizar para obterem uma reapreciação de uma decisão proferida ao abrigo da competência prevista no artigo 27.º, n.º 1, alínea i) , do CPTA, não há motivos para que se considere aquela interpretação normativa ofensiva do direito ao processo equitativo na dimensão em que reflete os princípios inerentes a um Estado de direito, da confiança e da segurança jurídica. O Tribunal Constitucional não ignora, até pelo que lhe é espelhado nos inúmeros processos que lhe têm chegado, tendo por objeto esta temática, que devido a uma utilização questionável das decisões previstas no artigo 27.º, n.º 1, alínea i) , do CPTA, e a uma contemporização inicial generalizada com a utilização do recurso como meio de impugnação dessas decisões, muitos recorrentes poderão ter sido surpreendidos

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