TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
228 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL De facto, a solução normativa em apreciação, ao impor ao requerente da AIM a instauração da ação de invalidação da patente, obriga a que logo no momento em que opta pela via procedimental traduzida em requerer a AIM, o respetivo requerente defina a sua estratégia processual: ou pretende ver invalidada a patente e terá de intentar a correspondente ação de declaração de nulidade ou anulação no TPI ou não tem efetivo interesse em questionar a validade da patente e desencadeia o pedido de AIM, sabendo que, na even- tual ação arbitral a que se sujeita, não poderá suscitar e ver decidida, com eficácia limitada às partes naquela ação, a exceção de nulidade. Enfatizando-se a circunstância de na génese do processo arbitral ter estado afinal uma iniciativa origi- nária do próprio demandado, a posição de demandado pode ser vista como consequência da sua anterior iniciativa procedimental ao despoletar o pedido de AIM. E sendo assim, não pode deixar de ter presente que um tal requerimento o coloca em posição de sujeição a uma ação arbitral, devendo, pois, contar com a possi- bilidade de lhe vir a ser oposto o direito emergente do reconhecimento e registo da patente. Deste argumento decorreria a conclusão de que não constitui ónus excessivo acautelar o seu direito através da interposição da ação de invalidação da patente logo que requer a AIM. Esta perspetiva ignora, porém, que pode não ser do interesse do requerente ou titular da AIM ver declarada a nulidade da patente, mas tão só defender-se da condenação que é pedida contra si na ação de arbitragem necessária. Pode bem ser que o seu interesse, enquanto demandado pelo titular da patente, se restrinja a impedir a condenação, ou dito de outro modo, a obter a absolvição do pedido de condenação por infração de patente (caso já tenha efetivamente introduzido o medicamento no mercado) ou simplesmente impedir a condenação a abster-se de introduzir aquele genérico (concorrente do medicamento de referência patenteado) no mercado, garantindo o início ou a continuação da sua atuação no mercado concernente àquele genérico. A anulação, com efeito erga omnes , da patente, pode mesmo apresentar-se como contrária aos seus inte- resses, na parte em que beneficia terceiros igualmente concorrentes do titular da patente. Numa perspetiva económica – e não devemos esquecer que o campo das patentes nos coloca no domínio dos exclusivos eco- nómicos concedidos como estímulos à inovação – o contencioso sobre a validade de um direito de patente cuja decisão tenha eficácia erga omnes projeta-se na liberdade de agir no mercado de múltiplos agentes eco- nómicos. Não é de todo claro qual seria o interesse de um agente acusado de infração a uma patente em fazer declarar a nulidade desta com efeitos erga omnes , incentivando a concorrência de outros agentes. A anulação da patente prossegue o interesse público na defesa da liberdade do mercado, promoção da sã concorrência e seus reflexos no público em geral, enquanto consumidor. No entanto, neste caso, a sua prossecução está a ser imposta ao agente económico que apenas pretende comercializar um medicamento genérico. Não é razoável impor-se ao requerente da AIM que promova e prossiga interesses de terceiros, bem como o interesse público no que diz respeito à validade da patente, ao fixar como única via a ação de declara- ção de nulidade ou anulação da patente. Desta forma, a solução normativa em apreciação obriga o requerente da AIM a tornar-se autor da ação de invalidação no TPI, mesmo contra a sua vontade, o que representa um condicionamento do seu direito de acesso aos tribunais e da sua liberdade de delinear a estratégia processual que seja mais consentânea com o seu interesse económico – o que está relacionado com a liberdade de ini- ciativa económica constitucionalmente tutelada. Não cabendo ao requerente da AIM a defesa do interesse dos terceiros, agentes económicos que com ele concorrem no mercado, ou do interesse público, impor-lhe o ónus de instaurar a ação de declaração de nulidade da patente, constitui necessária e inevitavelmente um encargo excessivo, em especial quando o Ministério Público tem legitimidade para instaurar ação de nulidade no TPI. É excessivo forçar o requerente da AIM a ter que recorrer ao TPI – com todos os custos associados a essa ação – para ali requerer a declaração de invalidade de uma Patente, com efeitos erga omnes , quando pode apenas invocar a sua invalidade, inter partes , para efeitos exclusivos de se defender do pedido de condenação que lhe foi especificamente dirigido.
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