TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017

22 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL razões discriminatórias ou arbitrárias, que permitam afirmar que se está perante uma constituição ou determinação ad hoc da formação judiciária em causa». 19.º Consubstanciando a própria Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, uma reforma da organização judiciária, não é, todavia, dessa última e específica problemática que trata o presente pedido, ao ter por objeto a norma vertida na alínea f ) , do n.º 4, do artigo 94.º da LOSJ, a ilegitimidade constitucional deste preceito emanando do sentido da própria solução normativa que o mesmo enforma. 20.º Na verdade, a reafetação que esta norma autoriza, não só não garante a ausência de arbitrariedade ou discricio- nariedade – sendo, ao invés, apta a induzi-las, com quebra do imperativo de aleatoriedade – na atribuição de um concreto processo a determinado juiz (ou juízes), como também ampara, per se, a possibilidade de práticas de desa- foramento ou determinação ad hoc , superveniente ou a posteriori, do foro concreto de apreciação de determinada causa, o que, com tais contornos casuísticos e, por conseguinte, discriminatórios, é proibido à luz das exigências constitucionais no domínio da administração da justiça (veja-se, outrossim, na mais recente jurisprudência do Tri- bunal Constitucional, com enfoque na dimensão garantística do princípio do juiz natural, o Acórdão n.º 41/16). 21.º Efetivamente, considero que o disposto na alínea f ) , do n.º 4, do artigo 94.º da LOSJ, ao permitir uma apre- ciação discricionária na base da proposta que compete aos presidentes dos tribunais de comarca, leva em si um risco de “manipulação arbitrária” das regras de atribuição da competência judicativa, o que é dizer, da competência para julgar uma causa concreta, o que não é de todo compatível com as exigências do princípio do juiz natural, conforme anteriormente expostas. 22.º E tal pode ocorrer não apenas por via da reafetação de juiz a outra secção da mesma comarca, como, e de forma ainda mais intensamente manifesta, mediante a afetação de processo a outro juiz que não o seu titular, o que acar- reta, como efeito necessário, a subtração da causa ao seu juiz natural ou legal. 23.º Em qualquer uma destas hipóteses, o que o legislador franqueou foi a possibilidade, dentro da própria organi- zação judiciária, da interferência e escolha não só individual – logo, subjetiva – como casuística do juiz ou tribunal da causa. 24.º No que especificamente toca à reafetação de juízes a outra secção da mesma comarca, importa fazer notar que a determinação normativa que emana da alínea f ) , do n.º 4, do artigo 94.º da LOSJ encontra-se bem distante de poder sustentar um critério legal de preordenação objetiva de transferência de juízes, nomeadamente para outra secção onde os mesmos façam mais falta. 25.º Reitero: a mobilidade de juízes ali visada tem na sua base um critério de aplicação subjetiva e casuística, o que autoriza uma influência arbitrária e discricionária na composição judiciária que há de intervir nas causas submeti- das a juízo, vulnerando-se, destarte, o sentido nuclear do princípio do juiz natural.

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