TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
218 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL industrial, relacionados com medicamentos de referência e medicamentos genéricos, independentemente de estarem em causa patentes de processo, de produto ou de utilização, ou certificados complementares de proteção. Simultaneamente, introduziu alterações no Regime Jurídico dos Medicamentos de Utilização Humana (Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de agosto, doravante designado por RJMUH), na parte relativa aos pedidos de AIM e ao dever de confidencialidade aí regulado, relevando a opção do legislador de não fazer depender a obtenção de uma AIM, bem como a sua alteração, suspensão ou revogação, da verificação da existência de direitos de propriedade industrial, como decorre do artigo 23.º-A do RJMUH, aditado pela Lei n.º 62/2011, de 12 de dezembro. Como salientado no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 123/15, ponto 12.4, «a opção essencial formulada pelo legislador na configuração do regime de arbitragem necessária assenta na autonomização (ou separação) da prévia tutela jurisdicional dos direitos de propriedade industrial derivados de patentes sobre medicamentos de referência, face ao procedimento administrativo conducente à obtenção de uma AIM rela- tiva a medicamentos genéricos (cfr. supra, 11.3.2). E isto, conforme consta da Exposição de Motivos, para assegurar o interesse público considerado relevante pelo legislador inerente à entrada célere de genéricos no mercado de medicamentos – assim, em particular, beneficiando os consumidores que acedem ao mercado de medicamentos genéricos mais acessíveis e, em geral, diminuindo os custos para o Estado e promovendo a concorrência no mercado e a liberdade de comercialização – por força da também célere e, sublinhe-se, prévia resolução dos litígios sobre a violação, ou não, de direitos de propriedade industrial – que envolvem, nesta fase, interesses predominantemente privados, também relevantes, e sem prejuízo de a respetiva resolu- ção se poder projetar a posteriori no procedimento administrativo da AIM» (jurisprudência retomada pelo Acórdão n.º 108/16, ponto 6). De acordo com a Exposição de Motivos da proposta de Lei n.º 13/XII que deu origem à Lei n.º 62/2011, o Relatório do Inquérito da Comissão Europeia ao Setor Farmacêutico calculou que seria possível «uma pou- pança adicional de 3 mil milhões de euros» nos gastos da República Portuguesa com medicamentos «se os genéricos tivessem entrado no mercado sem demora e que a entrada de genéricos nem sempre ocorre tão cedo quanto seria possível à luz do atual quadro jurídico aplicável». O mesmo documento citado identificou «como principais fatores de estrangulamento as intervenções das empresas produtoras de medicamentos ori- ginais nos procedimentos administrativos que visam a concessão da autorização de introdução no mercado, a autorização do preço de venda ao público e a autorização da comparticipação do Estado no preço dos medi- camentos, bem como as impugnações administrativas das mesmas decisões». Assim, com a proposta de lei em causa, pretendia o Governo «estabelecer um mecanismo alternativo de composição dos litígios que, num curto espaço de tempo, profira uma decisão de mérito quanto à existência, ou não, de violação dos direitos de propriedade industrial», instituindo «o recurso à arbitragem necessária para essa composição, solução já adotada, inclusive no âmbito dos conflitos atinentes aos direitos de autor». 10. Os traços gerais do novo mecanismo de composição de litígios instituído pela Lei n.º 62/2011 foram já identificados pelo Tribunal no Acórdão n.º 123/15, ponto 10.2, por referência aos seus artigos 2.º e 3.º, nos termos que aqui se reproduzem: « a) os litígios emergentes da invocação de direitos de propriedade industrial, incluindo os procedimentos cautela- res, quanto a medicamentos de referência ou medicamentos genéricos, ficam sujeitos a arbitragem necessária, institucionalizada ou não institucionalizada; b) os direitos de propriedade industrial invocados podem ser fundados em patentes de processo, de produto ou de utilização, ou em certificados complementares de proteção; c) o recurso à arbitragem pelo interessado que pretenda invocar o seu direito de propriedade industrial é feito no prazo de 30 dias a contar da publicitação pelo INFARMED, IP, na sua página eletrónica, dos pedidos de autoriza- ção, ou registo, de introdução no mercado de medicamentos genéricos, devendo fazê-lo junto do tribunal arbitral institucionalizado ou efetuar pedido de submissão do litígio a arbitragem não institucionalizada (prevendo-se, a
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