TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
203 acórdão n.º 250/17 8. Embora a inclusão dos terrenos para construção na previsão normativa da verba 28.1 da Tabela Geral de Imposto do Selo tenha de ser inserida no seu contexto normativo, em rigor não cabe, no âmbito do presente recurso, ajuizar a constitucionalidade daquela verba no seu todo, e menos ainda sindicá-la na sua redação original. Não se pode deixar de notar, contudo, que a tributação de manifestações avulsas de riqueza imobiliária não será o caminho adequado para cumprir os princípios da igualdade tributária e da capacidade contribu- tiva. Mesmo admitindo que a Constituição não impõe a criação de um imposto único sobre o património, como se afirmou com acerto no Acórdão n.º 590/15, isso não quer dizer que ela tolere indiscriminadamente a criação de impostos parciais, como aquele que aqui se analisa. Não está em causa a inserção sistemática de um mecanismo de tributação do património imobiliário no âmbito do Imposto do Selo, que tem sido utilizado pelo legislador como um imposto residual, ou comple- mentar, onde se inserem diferentes manifestações de riqueza não abrangidas por outros impostos, sem que daí advenha, por si só, qualquer desvio constitucional. Mas se a verba 28.1 da TGIS se assumiu como uma “taxa complementar de IMI”, dirigida “a discriminar os prédios de mais elevado valor patrimonial e sujeitá- -los a um regime fiscal mais gravoso que os restantes”, como sugere José Maria Fernandes Pires (cfr. Lições de Impostos sobre o Património e do Selo , 3.ª edição, Almedina Editora, Coimbra, 2015, p. 504), a mesma deveria englobar, ou pelo menos considerar, o conjunto do património imobiliário de cada contribuinte, sob pena de atingir os diferentes contribuintes de forma excessivamente desigual. Tanto mais que o imposto em ques- tão não é progressivo, e que basta por isso que o valor patrimonial tributário de um prédio seja inferior em apenas um euro ao milhão exigido pela referida verba para que o respetivo proprietário nada tenha a pagar, mesmo que seja proprietário de vários prédios desse valor. Há, de facto, um pecado original na verba 28.1 da TGIS, tal como ela foi concebida pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, e que, como veremos adiante, a Lei n.º 83-C/2013 agravou com o adi- tamento dos terrenos para construção à mencionada previsão normativa. É que, ao não alargar a base de tributação, pelo menos, ao conjunto do património imobiliário de cada contribuinte, não personalizando suficientemente o imposto, aquela verba não se revelou adequada a prosseguir “o princípio da equidade social na austeridade, garantindo uma efetiva repartição dos sacrifícios necessários ao cumprimento do programa de ajustamento”, como o legislador se propôs na exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 96/XII/2.ª, que esteve na origem da referida Lei n.º 55-A/2012. 9. Como dissemos anteriormente, a alteração de redação feita pela Lei n.º 83-C/2013, que aditou à verba 28.1 da TGIS os terrenos para construção, introduziu um fator de distorção no regime de tributação do património imobiliário que representa, não apenas uma distorção na coerência interna do conjunto do sistema fiscal, ou mesmo do Imposto do Selo considerado isoladamente, mas uma distorção na própria coe- rência interna da norma tributária contida na referida verba. De facto, ao reunir na mesma verba a tributação de casas de luxo e de terrenos para construção, no pres- suposto de que ambos se subsumem genericamente à categoria de bens imóveis de elevado valor patrimonial tributário, a norma cuja validade se discute confundiu manifestações de riqueza com fatores de produção dessa mesma riqueza. Tem sido salientado pela doutrina fiscal que, enquanto critério de igualdade tributária, o princípio da capacidade contributiva “exige, antes de mais, a personalização do imposto, que quando se tribute uma qualquer manifestação de riqueza se pergunte pela pessoa que está por trás dela e pelas condições em que se encontra” (cfr. Sérgio Vasques, “Capacidade contributiva, rendimento e património“, in Fiscalidade – Revista de Direito e Gestão Fiscal, n.º 23, Coimbra Editora, Coimbra, 2005, p. 19). Ora, se por trás do tributo imposto ao proprietário de uma casa de habitação de valor patrimonial superior a um milhão de euros poderá estar um contribuinte com força económica suficiente para suportar
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