TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
159 acórdão n.º 241/17 33.º Aquela já citada norma do art.º 75.º da LOE-2014, interpretada e aplicada como o fez a decisão recla- mada, o que determina é suspender/cessar o pagamento de complemento de pensões que estava previsto em IRCT’s, ou seja, o que faz é não apenas suspender unilateralmente disposições contratuais livremente acordadas pelas partes de uma dada convenção colectiva, 34.º Como também, para não dizer sobretudo, impedir, para futuro, e em função de uma condição totalmente dependente da vontade e da actuação do Governo e de verificação não apenas totalmente incerta como a ocorrer, ou não, num período temporal absolutamente indeterminado, o estabelecimento de quaisquer derrogações à refe- rida regra da chamada “suspensão” (verdadeira “cessação”) do pagamento do complemento. 35.º Mas o que o dito art.º 75.º da LOE, assim interpretado e aplicado, afinal o que faz é cessar a eficácia das situações jurídicas já perfeita e previamente estabelecidas por convenção colectiva de trabalho vigente, 36.º Pondo em causa esta em si mesma, e violando assim o art.º 56.º, n.º 3 da CRP, o qual garante – e de forma directa e imediata, e não derivada da lei ordinária – o direito à contratação colectiva, e com um mínimo de conteúdo útil (ou “conteúdo essencial”). 37.º A tutela que a convenção colectiva de trabalho necessariamente pressupõe – e que a referida garantia constitucional impõe – impede assim que o legislador ordinário lese, e para mais de forma tão marcante e decisiva (corte puro e simples) como aqui o fez, os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho já anteriormente celebrados e em pleno vigor à data da entrada em vigor da lei, 38.º A consagração constitucional do direito à contratação colectiva só é substancialmente respeitada se se respeitar a reserva de convenção colectiva, e esta mesma reserva integra e abrange também o objecto da própria contratação colectiva, significando isso que está vedado ao legislador ordinário imiscuir-se e alterar o “núcleo duro” de matérias que constituem tal objecto. 39.º Os beneficiários do referido complemento de reforma – como os AA. – condicionaram decisões relevantes da sua vida ao direito ou, pelo menos, à legítima expectativa de receberem os complementos de pensões de reforma que lhes estavam garantidos ou, pelo menos, e tal como o TC consagrou no recentíssimo Acórdão n.º 3/16, de 13 de janeiro, de que tinham a crença legítima e digna de protecção constitucional de que qualquer alteração legislativa, a ter lugar, manteria uma configuração dos referidos complementos de reforma consentânea com a sua finalidade e a sua natureza originais. 40.º Ora, tal consubstancia uma grave e totalmente infundamentada violação do princípio da protecção da confiança, enquanto decorrência do Estado de direito, consagrado, como é sabido, no art.º 2.º da CRP, tal como o mesmo TC, no supra citado Acórdão n.º 3/16 consignou relativamente às subvenções vitalícias dos políticos. Ademais, 41.º Esta medida lança na fome, na miséria e no desemprego os AA., retirando-lhes nalguns casos mais de metade do que era, para mais em plena época de crise, a sua única fonte de subsistência, atirando, só na Empresa Ré, uns milhares de pessoas para uma situação de enorme carência e gravidade económico-financeira, 42.º Enquanto (outra questão totalmente olvidada no despacho reclamado) o “benefício” (ou seja, a “pou- pança”) alegadamente alcançada com tal medida – aplicável a todas as empresas do Sector Empresarial do Estado e de forma muito particular a duas, o Metro de Lisboa e outra – ascende afinal a 11,3 ou, no máximo, 13 milhões de euros, ou seja, a qualquer coisa como 0,007% ou 0,008% do PIB (!?) ! 43.º Tudo isto bem mostra – o mesmo sucedendo se a pretensa “poupança fosse dos já anteriormente refe- renciados 13,6 milhões de euros, ou seja, 0.008% do PIB – o completo desequilíbrio entre o pretenso benefício colectivo que resultaria da medida em causa e as graves desvantagens e prejuízos para os cidadãos afectados, com nova e violenta, desnecessária e totalmente desadequada violação do basilar princípio da proporcionalidade ! 44.º Mais! Não é de todo compaginável com os princípios do Estado de direito exigir-se que o trabalhador de uma empresa do Sector Empresarial do Estado tenha de prever e de ter em conta que o acordo que ele (ou o respec- tivo Sindicato) celebrou com a administração da respectiva entidade empregadora possa afinal não ser cumprido, por o Estado, em cujo Sector Empresarial tal empresa se insere e que a tutela, assim o poder a todo o momento decidir e determinar !?
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