TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
147 acórdão n.º 237/17 sobre o decretamento de uma sanção não executada faz com que não possa falar-se de uma estabilização contrafác- tica das expectativas comunitárias, já apaziguadas ou definitivamente frustradas». 14.ª Na jurisprudência constitucional, o instituto da prescrição tem sido dimensionado como valor constitu- cionalmente atendível e como exigência do princípio jurídico-constitucional da proporcionalidade (Acs. 483/02, 625/13 e 297/16). 15.ª A suspensão e interrupção da prescrição da pena, interferindo no curso dos prazos de prescrição, justi- ficam-se pela verificação de certas situações processuais que impossibilitam a execução imediata da pena e pela prática pelo Estado de determinados atos, com impacto fora do processo, junto da comunidade e do condenado – assim mantendo nos dois planos a atualidade da pena –, ou seja, com o alcance de não deixar a pena aplicada cair no esquecimento. 16.ª Na redação originária do CPenal de 1982, como causa de interrupção da prescrição da pena, a par da sua execução, previa-se «a prática, pela autoridade competente, dos atos destinados a fazê-la executar, se a execução se tornar impossível por o condenado se encontrar em local donde não possa ser extraditado ou onde não possa ser alcançado» [art. 124.º, n.º 1, alínea b) ]. 17.ª Publicado, entretanto, o DL 78/87, de 17 de fevereiro, que aprova o vigente CPP, que introduz um novo instituto: a declaração de contumácia (art. 336.º, na redação originária; arts. 335.º/337.º, na atual). 18.ª. Com a referida reforma penal de 1995, como causa de interrupção da prescrição da pena, igualmente a par da sua execução, o CPenal substitutivamente passou a consignar «a declaração de contumácia» [art. 126.º, n.º 1, alínea b) ]. 19.ª É para acautelar o decurso do prazo de prescrição da pena de prisão, decretada subsidiariamente nos termos do art. 49.º do CPenal, uma vez que os mandados de detenção para cumprimento da mesma não foram cumpridos por desconhecimento do paradeiro do condenado, que o Ministério Público promove junto do TEP que seja proferido despacho de declaração de contumácia, de harmonia com o disposto no art. 97.º, n.º 2 do CEP – sobre tal promoção recai o Despacho ora recorrido, a julgar inconstitucional a aplicação ao caso do disposto nos arts. 97.º, n.º 2 e 138.º, n.º 4, alínea x) do CEP, por ofensa dos arts. 18.º, n.º 2 e 26.º, n.º 1 da Constituição. 20.ª O art. 18.º da Constituição – que, no que respeita à determinação do seu âmbito, deverá ser conjugado com o artigo anterior – garante a força vinculativa direta das liberdades, direitos e garantias constitucionais, não apenas nas relações entre os particulares e o Estado (as que ora aqui relevam), mas nas próprias relações entre aqueles. 21.ª As normas contidas nesse artigo «condensam os princípios fundamentais de uma doutrina ou teoria geral de direitos, liberdades e garantias constitucionalmente adequada». 22.ª Dispõe o n.º 2: «A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previs- tos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos». 23.ª Ou seja: «Para que a restrição seja constitucionalmente legítima, torna-se necessária a verificação cumula- tiva das seguintes condições: (a) que a restrição esteja expressamente admitida (…) pela Constituição, ela mesmo (n.º 2, 1.ª parte); (b) que a restrição vise salvaguardar outro direito ou interesse constitucionalmente protegido (n.º 2, in fine ); (c) que a restrição seja exigida por essa salvaguarda, seja apta para o efeito e se limite à medida necessária para alcançar esse objetivo (n.º 2, 2.ª parte);(…)». 24.ª E, relativamente ao segundo pressuposto material enunciado: tal restrição legítima «consiste em que ela só pode se justificar para salvaguardar um outro direito ou interesse constitucionalmente protegido (n.º 2, in fine ). Este requisito – constitucionalmente explicitado apenas na revisão constitucional de 1982 – significa fun- damentalmente que o sacrifício, ainda que parcial, de um direito fundamental, não pode ser arbitrário, gratuito, desmotivado (…)». 25.ª O art. 26.º, n.º 1 da Constituição, entre os direitos de personalidade (direitos pessoais) enumerados que gozam de proteção constitucional, consigna o direito à capacidade civil – é precisamente a ofensa ilegítima de tal direito que, na economia do Despacho recorrido, nuclearmente funda o juízo de inconstitucionalidade.
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