TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 99.º volume \ 2017
107 acórdão n.º 213/17 ter amputado o segmento daquela decisão que atribuiu ao arguido certas “referências ao que aconteceu” para assim caracterizar a sua atual relação com o crime cometido. Uma vez mais, é manifesta a falta de razão do reclamante. Independentemente do caráter verdadeiramente normativo da asserção impugnada – ao qual sempre poderia opor-se o facto de, na referência às “supostas declarações indiretas, alegadamente prestadas pelo arguido a terceiros”, a mesma acomodar elementos extraídos diretamente das particularidades da situação sub judice , na configuração que lhe é dada pelo recorrente −, o certo é que, nem tal segmento foi suprimido na decisão ora reclamada, nem ao mesmo pode ser razoavelmente atribuído um qualquer significado suscetível de assegurar a recondução da interpretação impugnada à ratio decidendi da decisão proferida pelo Tribunal de Execução de Penas. Com efeito, o que se afirmou na decisão ora reclamada foi que, «[a]pesar de ter incluído no elenco dos factos “com interesse para a decisão a proferir”, apurados “em resultado da análise e discussão ocorridas no decurso da reunião” do conselho técnico, a circunstância de o condenado “não fala[r] do crime” e, nas referências ao sucedido, tender para a atribuição da “responsabilidade do que ocorreu à vítima”, o tribunal a quo em momento algum reportou o estabelecimento desse facto a declarações do arguido meramente hipo- téticas – isto é, cuja prestação se tivesse para o efeito limitado conjeturar −, e/ou presumivelmente prestadas a terceiros – no sentido de produzidas de forma não certa mas apenas provável, perante pessoas distintas de qualquer um dos membros intervenientes naquele órgão» (sublinhado aditado). Para além de não poder ser outro o significado razoavelmente atribuível à formulação seguida pelo pró- prio recorrente – “supostas declarações indiretas, alegadamente prestadas pelo arguido a terceiros”−, preten- deu-se com o referido excerto deixar claro que, ao contrário do que é pressuposto pela dimensão impugnada, o tribunal a quo extraiu a solução do caso, não da mera hipótese de tais referências terem sido realizadas, mas da convicção de que efetivamente o foram, independentemente de terem sido produzidas perante pessoa ou entidade diversa do Tribunal. Acresce que, se a questão pretendida controverter pelo recorrente é, afinal, a de saber se, para caracterizar o modo como o arguido perceciona e vivencia o facto criminoso no momento presente, o Juiz de Execução de Penas deverá poder atender, mesmo no caso de as tomar por certas, às referências que a tal facto sejam por aquele realizadas sempre que estas ocorrerem perante pessoa ou entidade diversa do Tribunal, então estare- mos em presença de uma questão não apenas distinta daquela que foi enunciada no requerimento de inter- posição do recurso, como, desde logo, tematicamente estranha ao regime dos pressupostos da concessão de licença de saída jurisdicional constantes do artigo 78.º, n.º 1, alíneas a) e b) , e n.º 2, alínea a) , do CEPMPL − o único indicado pelo recorrente. E mesmo que a tais preceitos se associasse, conforme reivindicado pelo ora reclamante, a regra que consta do n.º 2 do 191.º, igualmente do CEPMPL – que confere caráter facultativo à audição do arguido pelo Juiz de Execução de Penas −, continuaria a tratar-se de uma questão que, por dizer respeito à idoneidade ou aptidão dos meios probatórios considerados, remeteria necessariamente para as disposições do Código de Processo Penal que o artigo 154.º do CEPMPL determina serem subsidiariamente aplicáveis aos atos a praticar no âmbito do processo de concessão de licença de saída jurisdicional, regulado nos respetivos artigos 189.º a 193.º 8. A segunda objeção colocada diz respeito ao segmento da decisão reclamada que concluiu pela impos- sibilidade de conhecer do objeto do recurso na parte tendente à declaração de inconstitucionalidade da “interpretação normativa”, alegadamente extraída pelo tribunal a quo do artigo 191.º, n. os 1, 2 e 3, do CEPMPL, “no sentido de poderem ser vertidas na Ata supostas declarações indiretas alegadamente prestadas pelo arguido a membros do conselho técnico não identificados em concreto na Ata, não tendo o TEP proce- dido a audição direta do arguido”. De acordo com o ora reclamante, ao ter considerado demonstrado o facto de o arguido “não fala[r] do crime, sendo reservado relativamente a tal matéria” e, nas referências ao sucedido, tender para a atribuição da “responsabilidade do que ocorreu à vítima, que considera uma pessoa complicada”, o tribunal a quo
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