TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
69 acórdão n.º 519/16 Segundo: se, por justa indemnização, dever entender-se «indemnização completa», «equilibrada compensa- ção», «entrega de equivalência», «substituição de valor patrimonial», etc. (expressões todas a significar indemni- zação total) – questão que, aqui, não tem que decidir-se –, então é seguro que essa regra só vale para a clássica expropriação por utilidade pública (e, naturalmente, para a requisição), mas não também para a nacionalização de bens económicos (cfr., neste sentido, também Luís S. Cabral de Moncada, loc. cit.). O artigo 82.º da Lei Fundamental preceitua, com efeito: Artigo 82.º [..] A lei determinará os meios e as formas de intervenção e de nacionalização e socialização de meios de produção, bem como os critérios de fixação de indemnizações. Assim – ao menos para o efeito da indemnização – o artigo 62.º, n.º 2, da Constituição atrás transcrito não se aplica à nacionalização de bens económicos. Para esta, rege o citado artigo 82.º que permite à lei definir «critérios de fixação de indemnizações». A este propósito, escrevem J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, na anotação IV ao artigo 82.º: A Constituição, ao referir-se aqui a critérios específicos de indemnização, aponta claramente para uma distinção entre o regime das indemnizações por nacionalização (as previstas neste artigo) e o das indemnizações por expropriação em sentido estrito (cfr. artigo 62.º, n.º 2). Terceiro: se, por justa indemnização, dever ainda entender-se – como pretende certa doutrina – indem- nização prévia, com a consideração de que o seu prévio pagamento faz parte da «estrutura institucional da expropriação», constituindo, por isso, um «pressuposto de legitimidade ( conditio iuris ) do exercício do poder de expropriar» (cfr. Garcia de Enterría e Fernández Rodríguez, Curso de Derecho Administrativo , Madrid, 1981, pp. 251 e segs.) – o que, aqui, não tem também que resolver-se –, então essa regra decerto que não vale para as nacionalizações. [Sobre o conceito de justa indemnização utilizado no artigo 62.º da Constituição, vide Acórdão deste Tribunal n.º 341/86, publicado no Diário da República , 2.ª série, de 19 de março de 1987, cuja doutrina foi adoptada em arestos posteriores não apenas deste Tribunal como dos tribunais de relação (cfr., a título de exemplo, o Acórdão da Relação do Porto de 28 de Maio de 1987, publicado na Colectânea de Juris- prudência, ano XII, 1987, t. 3, p.172).] Se é verdade que um diferimento por tempo indeterminado e incontrolável do pagamento da indemniza- ção pode convertê-la numa falsa indemnização ( qui tardius solvit minus solvit ) – o que é susceptível de violar a confiança que, num Estado de direito, os cidadãos devem poder depositar na ordem jurídica –, o Estado não tem por que proceder ao desembolso efectivo do preço antes de entrar na posse dos bens nacionalizados («pronta compensação»). O princípio de justiça, que deve reger o dever de indemnizar, é perfeitamente compa- tível com formas de pagamento diferido, como, por exemplo, a entrega de títulos de dívida pública livremente negociáveis e amortizáveis em prazos razoáveis. A este propósito escrevem J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. , na anotação XII ao artigo 62.º: É de referir ainda que a Constituição, embora não exija expressamente que a indemnização seja prévia à expropriação, parece exigir que ela seja um elemento integrante do próprio acto de expropriação («mediante expropriação»). Menos exigente parece ser, também aqui, o regime das indemnizações por efeito de naciona- lização (cfr. artigo 82.º). (…) Como se disse já, o artigo 82.º dispõe que a lei determinará os critérios de fixação das indemnizações. Por conseguinte, tendo, embora, que haver sempre indemnização – salvo, naturalmente, no caso do artigo 87.º, n.º 2 –, o critério do sua fixação não tem por que ser o mesmo para todo o tipo de casos. Esses critérios podem, inclusivamente, ser diferentes conforme o tipo e o montante dos bens nacionalizados (cfr., neste sen- tido, J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. , p. 407). Questão é que esses critérios, embora diferentes, respeitem o princípio de justiça que vai implicado na ideia de Estado de direito. Ora, isso exige que esses critérios não sejam susceptíveis de conduzir ao pagamento de indemnizações irrisórias ou manifestamente desproporcionadas à perda dos bens nacionalizados, nem a pagamentos tão dife- ridos no tempo que equivalham a indemnizações irrisórias ou absolutamente desproporcionadas. E questão
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