TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
576 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Conforme resulta do teor das decisões reclamadas, os recursos de constitucionalidade pretendidos interpor não foram nessa parte admitidos por se ter concluído não só pela inverificação do requisito da suscitação prévia, como ainda pela ausência do caráter normativo do respetivo objeto, esta denunciada pelo facto de o vício de constitucionalidade invocado exprimir, na realidade, a discordância dos reclamantes relativamente à decisão de fazer improceder o recurso interposto da decisão proferida em primeira instância quanto à impugnação da matéria de facto, numa tentativa de converter este Tribunal numa “2.ª instância de recurso ordinário”. Tais considerações, expendidas nas decisões ora reclamadas, são inteiramente procedentes. Conforme vem sendo reiteradamente afirmado na jurisprudência deste Tribunal, os recursos interpos- tos no âmbito da fiscalização concreta da constitucionalidade, não obstante incidirem sobre decisões dos tribunais, têm um objeto estritamente normativo no sentido em que apenas podem visar a apreciação da conformidade constitucional de normas ou interpretações normativas, e não, sequer também, das decisões judiciais, em si mesmas consideradas (cfr. Acórdãos n. os 466/16 e 469/16). Quer isto significar que, contrariamente ao que sucede com a figura do recurso de amparo, o acesso à jurisdição constitucional no âmbito da fiscalização concreta, tal como perspetivado no artigo 280.º da Cons- tituição, não se destina à sindicância “da possível e direta violação de direitos fundamentais, especificamente tutelados pela Constituição, por concretos atos ou decisões, maxime do poder jurisdicional” (cfr. Carlos Lopes do Rego, Os recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, Almedina, 2010, p. 26), mas apenas ao critério ou padrão normativo que lhes subjaza, entendido este como uma “regra abstratamente enunciada (ou enunciável) e vocacionada para uma aplicação potencialmente genérica” ( ob. cit. , p. 106). Ora, ao sediarem o vício de constitucionalidade nos concretos termos em que o Tribunal da Relação do Porto procedeu à reapreciação do quadro factual traçado em juízo pela primeira instância, imputando-o à decisão recorrida sob a acusação de que tal reapreciação se quedou aí pela “simples enumeração dos meios de prova apreciados em 1.ª instância”, acompanhada da genérica afirmação de que a “primeira instância apreci[ara] a globalidade da prova e julg[ara] de acordo com a livre apreciação da prova”, sem explicitar o “processo de formação da [respetiva] convicção”, é manifesto que os recorrentes atribuem a alegada violação do direito ao recurso, consagrado no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, ao resultado da atividade pondera- tiva própria das instâncias – mais concretamente ao modo como foi realizada a sindicância da valoração dos meios de prova produzidos e analisados pelo Tribunal Judicial de Santa Maria da Feira − e não aos preceitos legais em si mesmos considerados ou a qualquer interpretação que dos mesmos houvesse sido efetivamente extraída pelo tribunal a quo para fundamentar, nessa parte, a improcedência dos recursos que recaíram sobre o primeiro dos acórdãos proferidos nos autos. Sendo a tese unanimemente defendida pelos ora reclamantes, conforme se viu, a de que o Tribunal da Relação do Porto não procedeu à reapreciação das provas apresentadas como impondo uma decisão diversa relativamente aos factos impugnados, nem ao exame crítico das mesmas, tendo-se ao invés limitado a afirmar que o julgador em primeira instância analisara a prova e, fazendo uso pleno da faculdade de livre apreciação, detalhara a convicção a que havia chegado, é evidente que a pretensão subjacente aos interpostos recursos de constitucionalidade mais não é do que a de ver sindicada a correção da ponderação levada a cabo por aquela instância, na dimensão relativa à reavaliação e valoração dos meios de prova carreados para os autos e à con- sequente reapreciação da matéria de facto. Tal dimensão encontra-se, porém, subtraída à sindicância deste Tribunal, assim se justificando, também nesta parte, a confirmação das decisões reclamadas. d) Inconstitucionalidade imputada ao artigo 14.º do RGIT 15. A última das questões de constitucionalidade suscitadas nos requerimentos de interposição de recurso que vimos considerando é a que se prende com a solução legal constante do n.º 1 do artigo 14.º RGIT, norma de acordo com a qual a “suspensão da execução da pena de prisão aplicada é sempre condicionada ao
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