TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
570 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ao princípio da legalidade criminal consagrado no artigo 29.º da Constituição, foi expressamente colocada por cada um dos reclamantes perante o tribunal a quo, que, no acórdão recorrido, a considerou destituída de fundamento, no essencial porque contrária à orientação prevalecente, tanto na doutrina como na juris- prudência, sobre do problema da admissibilidade constitucional das chamadas “normas penais em branco”. Considerando resultar das sucessivas decisões deste Tribunal sobre a matéria que às normas penais em branco se não colocam quaisquer reservas de constitucionalidade sempre que as normas chamadas a comple- tar a norma penal – conforme se entendeu suceder com aquelas para que remete o n.º 3 do o artigo 103.º do RGIT – “não contenham inovatoriamente a definição de elementos relevantes do próprio tipo de crime aplicável às infrações”, o tribunal a quo concluiu para manifesta ausência de fundamento dos recursos de constitucionalidade, não os tendo admitido nessa parte nos termos previstos no segmento final do n.º 2 do artigo 76.º da LTC. Pois bem. Prevendo o n.º 2 do artigo 76.º da LTC os fundamentos com base nos quais o tribunal a quo pode indeferir o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, importa começar por notar que a última das hipóteses aí contempladas se prende justamente com os casos em que, tratando-se de recurso interposto ao abrigo das alíneas b) ou f ) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, o mesmo se mostre “mani- festamente infundado”. De acordo com o entendimento reiteradamente expresso na jurisprudência constitucional, recursos manifestamente infundados, para os efeitos previstos no n.º 2 do artigo 76.º da LTC, não são apenas os recursos processualmente inadmissíveis − isto é, os recursos relativamente aos quais se não verifiquem os pressupostos processuais de admissibilidade estabelecidos nos artigos 70.º, n. os 1, alínea a) , e 2, e 72.º, n.º 2, ambos da LTC. Até porque os conceitos de manifesta ausência de fundamento e inadmissibilidade processual, de acordo com o sentido que comummente lhes é atribuído, são suficientemente distintos entre si para excluir a pos- sibilidade de o legislador os ter confundido ao ponto de fazer uso do primeiro para se referir ao exato con- teúdo do segundo, tem este Tribunal repetidamente afirmado que se trata aqui de causa de não admissão que, contrariamente às demais previstas no n.º 2 do artigo 76.º da LTC, apresenta “uma irrecusável compo- nente substantiva”, impondo desse modo “uma certa avaliação dos fundamentos do recurso” (cfr. Acórdãos n. os 501/94, 569/95, 294/99, 622/99, 304/00, 482/04, 673/04, 269/06, 181/11, 276/12, 215/14, 269/14 e 72/15). Tal avaliação, embora não possa ser feita equivaler à verificação que teria lugar no julgamento do próprio recurso, pressupõe, ainda assim, uma apreciação, ainda que sumária, dos fundamentos que lhe subjazem, legitimando a sua não admissão sempre que − embora apenas quando −, através dessa apreciação for possível concluir, de forma inequívoca, pela respetiva inatendibilidade. Tal inatendibilidade, embora deva ser notória em si mesma, pode ser naturalmente estabelecida através da concomitante convocação de argumentos extraídos da própria jurisprudência seguida por este Tribunal em casos idênticos ou paralelos, sempre que à luz desses argumentos se torne (ainda) mais inequívoca a ausência do “mínimo de consistência substancial no ferimento da Lei Fundamental” sob alegação do qual o recurso é interposto (cfr. neste sentido, Acórdãos n. os 269/06, 72/15 e 271/14, ainda que por remissão para o critério articulado no Acórdão n.º 616/05). Visa-se, desde modo, “facultar ao tribunal a quo a possibilidade de formulação de um juízo sobre a via- bilidade ou razoabilidade da pretensão do recorrente, por forma a obviar à subida a este Tribunal de recursos interpostos com fins manifestamente dilatórios, cuja inatendibilidade é liminarmente evidente ou ostensiva (…)” (cfr. Acórdãos n. os 389/10 e 271/14), sem que daí advenha qualquer diminuição das garantias que de outro modo seriam reconhecidas ao recorrente. Nas hipóteses em que é inequívoca a inatendibilidade dos fundamentos do recurso, a atribuição ao tribunal a quo da faculdade de o não admitir apresenta a vantagem de permitir dispensar o desenvolvimento
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