TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

558 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Parece querer referir-se àquilo que se convencionou chamar Decisão surpresa. Ora, é pacífico na Jurisprudência o entendimento de que apenas se está perante uma decisão surpresa quando ela comporta uma solução jurídica que os sujeitos processuais não tinham obrigação de prever, quando não fosse exigível que o interessado a houvesse perspetivado no processo, tomando oportunamente posição sobre ela, ou até quando a decisão coloca a discussão jurídica num diferente plano daquele em que o sujeito processual o havia feito. Como é evidente, tal não ocorre no caso. Quanto à terceira questão de inconstitucionalidade – essa, sim, suscitada previamente –, considerou-se na decisão deste Tribunal que se trata «de questão mais do que repisada, tal como afirma o M.º P.º no seu Parecer: o problema da inconstitucionalidade de tal preceito, por constituir um a norma penal em branco, já foi suficiente- mente tratado pela jurisprudência e doutrina, estando, em nosso entender, suficientemente estabilizado para poder ser, com razoabilidade, posto em causa. Repetindo o referido no recurso do A., trata-se de tema mais do que repisado. Assim o afirma o M.ºP.º nesta instância: o problema da inconstitucionalidade de tal preceito, por constituir uma norma penal em branco, já foi suficientemente tratado pela jurisprudência e doutrina, estando, em nosso entender, suficientemente estabilizado para poder ser, com razoabilidade, posto em causa. Norma penal em branco é uma norma cujo conteúdo carece de ser completado por outras normas, o que é admissível desde que elas não contenham inovatoriamente a definição de elementos relevantes do próprio tipo de crime aplicável às infrações, o que manifestamente é o caso. A remissão que se opera, não comporta o acrescentar de nenhum elemento à configuração da conduta típica constante da previsão em causa. Não se pode, por outro lado, afirmar violadas as competências legislativas, uma vez que a norma complementar só pode ser emanada do órgão com competência legislativa em matéria fiscal. Ou seja, como se escreve no Parecer do M.º P.º a norma complementar, respeita as mesmas exigências de lega- lidade da norma penal que a prevê. A remissão para os preceitos fiscais (enquanto técnica legislativa admissível) não viola o princípio da legalidade, nem suscita qualquer dúvida de índole constitucional.» É, pois, manifesto inexistir a invocada inconstitucionalidade”. iv) Arguido D.: Quanto à 1.ª questão [al. A) ], mostra-se evidente – antes de mais – faltar o requisito da suscitação prévia da questão da inconstitucionalidade, em momento em que este Tribunal ainda pudesse conhecer das questões, ou seja, antes de esgotar o seu poder jurisdicional sobre a matéria a que a pretensa inconstitucionalidade respeita. O recorrente pretende tornear a falta deste requisito afirmando que a suposta interpretação normativa «emerge do próprio Acórdão recorrido de forma inesperada não sendo exigível ao recorrente que antevisse a interpretação anómala feita pelo Tribunal da Relação do Porto». Ora, é pacífico na Jurisprudência o entendimento de que apenas se está perante uma decisão surpresa quando ela comporta uma solução jurídica que os sujeitos processuais não tinham obrigação de prever, quando não fosse exigível que o interessado a houvesse perspetivado no processo, tomando oportunamente posição sobre ela, ou até quando a decisão coloca a discussão jurídica num diferente piano daquele em que o sujeito processual o havia feito. Como é evidente, tal não ocorre no caso. Ainda que não se verificasse a falta desse requisito, é ostensivo que a interpretação normativa, cuja fiscalização se pretende suscitar, não integra a ratio decidendi da decisão que se pretende recorrer. O que se extrai da argumentação vertida é que a suposta questão de inconstitucionalidade enunciada constitui um mero pretexto, pois aquilo de que se discorda realmente, e cuja apreciação pelo Tribunal Constitucional se pre- tende suscitar, é a decisão de improcedência da impugnação da matéria de facto, assim se procurando usar aquele Tribunal como uma 2.ª instância de recurso ordinário.

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