TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

526 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Ora, se a contrariedade de uma norma legislativa interna com uma convenção internacional, incluindo os tratados constitutivos da União Europeia, não pode relevar como questão de inconstitucionalidade para efeitos de fiscalização concreta pelo Tribunal Constitucional, por maioria de razão não reveste tal natureza a questão da contrariedade de norma constante de ato legislativo interno com norma de direito derivado da União Europeia (nesse sentido, vide, por exemplo, os Acórdãos n. os 326/98, 621/98, 93/01, 164/01 e 598/04). Por outro lado, também se poderá argumentar, conforme defende José Manuel Cardoso da Costa, em posição acolhida, por exemplo, nos Acórdãos n. os 621/98, 466/03 ou 598/04: «[Há] uma circunstância específica que [ocorre no caso da incompatibilidade do direito interno com o direito da União Europeia] e que, mais facilmente (ou com maior razão) do que na hipótese de contrariedade de uma norma interna com uma qualquer convenção internacional, pode (ou mesmo deve) conduzir a que se rejeite a qualificação da incompatibilidade do direito interno com o direito comunitário como uma situação de ‘inconsti- tucionalidade’ que ao Tribunal Constitucional caiba apreciar. Reside essa circunstância no facto de que, diferentemente (ou para além) do que sucede na receção interna do direito internacional convencional em geral, a receção do direito comunitário envolve (ou envolveu) também a dos mecanismos institucionais que visam especificamente garantir a sua aplicação. Ora, compreendendo a ordem jurídica comunitária – recebida nestes termos ‘compreensivos’ e globais pelo direito português, logo por via de uma cláusula da própria Constituição – uma instância jurisdicional precipuamente vocacionada para a sua mesma tutela (e não só no plano das relações interestaduais ou governamentais), e concentrando ela nessa instância a compe- tência para velar pela aplicação uniforme e pela prevalência das suas normas, seria algo incongruente que se fizesse intervir para o mesmo efeito, e no plano interno, uma outra instância do mesmo ou semelhante tipo (como seria o Tribunal Constitucional). Dir-se-á, assim, que não deverá reconduzir-se a contrariedade de uma norma interna com outra de direito comunitário a uma categoria ou a um conceito dogmático cuja utilização ou aplicação na hipótese (embora possível num certo entendimento dele) implicaria retirar aos tribunais internos comuns a deci- são definitiva daquela questão, na correspondente esfera”.» (v. Autor cit., “O Tribunal Constitucional português e o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias” in Ab Uno Ad Omnes, Coimbra Editora, Coimbra, 1998. pp.1363 e segs., p. 1371). 13. A adução de um parâmetro, através da invocação na resposta ao parecer do Ministério Público do princípio da legalidade penal, consagrado no artigo 29.º, n.º 1, da Constituição, não altera os dados do problema, uma vez que a invocação desse princípio também é feita decorrer de violação de uma norma inter- posta entre a norma constitucional e a norma sindicada, i.e., como simples instrumento de controlo da com- patibilidade do Direito Interno com o Direito da União Europeia, o que não é possível efetuar no âmbito do artigo 70.º, n.º 1, alínea b) , da LTC. É o que avulta da afirmação de indevido “alargamento do tipo objetivo” por efeito da incompatibilidade entre a interpretação normativa aplicada e “os dados normativos que resul- tam do direito da União Europeia” (cfr. ponto 25 da resposta ao parecer). A circunstância do artigo 79.º-C da LTC permitir que o Tribunal Constitucional confronte a norma impugnada com outros parâmetros, para além daquele(s) inicialmente invocado(s) pelo recorrente é, aqui, irrelevante: essa faculdade pressupõe que a questão a apreciar se insira na competência do Tribunal Cons- titucional, não podendo naturalmente ser exercida quando, como sucede no presente caso, o recurso visa a apreciação duma questão cujo conhecimento extravasa as competências deste Tribunal. Por último, o facto do Tribunal Constitucional se enquadrar na noção de “órgão jurisdicional” de um Estado-Membro, para efeitos do disposto no artigo 267.º do TFUE, detendo competência para a formulação de questões prejudiciais, não comporta, no caso vertente, cabimento, uma vez que esse poder apenas deve ser exercido nas situações em que o questionamento releve para o julgamento a formular, não fazendo sentido

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