TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

503 acórdão n.º 697/16 de se considerar inconstitucional por violação do princípio da igualdade aludido no artigo 13.º da Cons- tituição». Apreciando a arguição de inconstitucionalidade, considerou o tribunal recorrido haver razões relacio- nadas com a qualidade da pessoa coletiva pública que tem o domínio sobre tais bens e a natureza destes que justificavam o «alargamento do prazo de proteção dos bens do domínio privado face à usucapião», em relação aos prazos gerais: «Por um lado, uma pessoa coletiva pública tem uma ligação com as coisas que lhe pertencem que não é assimi- lável à proximidade que usualmente caracteriza a ligação entre um proprietário e os seus bens, o que naturalmente dificulta a possibilidade de conhecer, a todo o tempo, as pretensões e posições dos particulares relativamente àqueles. Por outro lado, importa não esquecer que a usucapião de um bem integrado no domínio privado de uma pessoa coletiva pública acarreta uma lesão no interesse coletivo, o que, como se crê evidente, tem uma ressonância económica e social maior do que a aquisição, pela mesma via, de um bem que estava na esfera de um privado ou de uma pessoa coletiva privada» Por isso se concluiu que o diferenciado tratamento legislativo, tendo adequado suporte material, não violava o princípio da igualdade, na dimensão de «proibição do arbítrio legislativo». A recorrente, sem invocar quaisquer novos argumentos em relação ao enunciado juízo de não inconstitucionalidade, limita-se a repetir, no presente recurso, que o «privilégio que a norma do artigo 1.º da Lei n.º 54, de 16 de julho de 1913, concede ao Estado em relação ao comum dos cidadãos, não pode deixar de se considerar inconstitucional por violação do princípio da igualdade aludido no artigo 13.º da Constituição». 16. Como tem sido amplamente afirmado, o princípio constitucional da igualdade não impõe ao legislador o sentido da solução normativa que deve estabelecer para a multiplicidade e variedade das situações da vida que reclamam definição jurídica. Neste domínio, vigora o princípio da liberdade de conformação legislativa ou a chamada «discricionariedade legislativa», competindo ao legislador, e só a ele, escolher quais as situações que exigem um tratamento idêntico ou diferenciado e estabelecer, em relação a elas, o regime jurídico considerado adequado. O que não pode é atuar arbitrariamente, introduzindo diferenças de tratamento que se mostrem ser manifestamente infundadas ou destituídas de racionalidade lógico-valorativa. É neste ponto que se justifica a intervenção do julgador, em defesa do princípio consti- tucional da igualdade, que, assim funciona, como «princípio negativo de controlo» ou «limite externo da liberdade de conformação», e não como critério positivo de sindicância da justiça material ou relativa das soluções adotadas pelo legislador (sublinhado este aspeto, entre outros, o Acórdão do Tribunal Constitu- cional n.º 94/15). 17. Sendo esta a perspetiva constitucional a adotar, na avaliação da constitucionalidade da norma em causa, há, assim, que verificar se o alargamento do prazo da usucapião nela consagrado, em relação aos prazos gerais, carece de qualquer fundamento material ou, ao invés, encontra nas especificidades da hipótese nor- mativa a que se aplica fundada razão de diferença. Estão em causa bens do domínio privado dos institutos públicos, em cuja categoria se integra o Insti- tuto da Habitação e Reabilitação Urbana, I.P., que, como tal, se entendem como bens do domínio privado estadual.

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