TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

466 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL sistema de fiscalização concreta da constitucionalidade normativa. IV – Acresce que, se o conceito de norma relevante para efeitos da delimitação do objeto idóneo dos recur- sos de constitucionalidade fosse aquele que está implícito nas alegações do recorrente, a viabilidade destes deixaria de se basear num pressuposto objetivo e controlável para ficar inteiramente dependente do maior ou menor engenho demonstrado pelo recorrente na redação do requerimento de interposi- ção do recurso, pelo que ao absurdo lógico somar-se-ia então a iniquidade processual. V – Por outro lado, a equação entre norma-objeto de controlo de constitucionalidade e norma-regra geral e abstrata é incompatível com a ideia, há muito assente na jurisprudência deste Tribunal, do conceito funcional de “norma”, do qual resulta não apenas que pode haver normas nesse sentido funcional que não são regras gerais e abstratas – nomeadamente as denominadas leis-medida ou leis-providência – como também que pode haver normas no sentido doutrinário ou metodológico do termo que não são normas no sentido funcionalmente adequado ao exercício da justiça constitucional, sendo justamente este último o caso daquelas razões das decisões jurisdicionais que não são recondutíveis a atos da autoridade pública dotados de força externa, ou seja, que o tribunal a quo não acolhe enquanto fonte de direito por força da sua subordinação ao princípio da legalidade, mas que resultam da aplicação de direito para além da lei, ou da interpretação de preceitos constitucionais diretamente aplicáveis, pela sua natureza ou por imposição legal, ao caso sub judice ; suscetíveis de controlo pela jurisdição constitucional são, por princípio, apenas as razões heterónomas da justiça comum, aquelas normas infraconstitucionais que os tribunais aplicam em virtude da autoridade política, originária ou delega- da, dos seus autores. VI – Ora, as normas jurisdicionais ou «normas do caso» não têm essa natureza política porque não têm caráter inovatório ou eficácia externa, dado que o poder jurisdicional é o poder de aplicar direito pré-existente e a sentença produz efeitos apenas no caso concreto; a autoridade dispositiva do poder judicial cinge-se por isso ao caso decidendo, o que significa que apesar de as suas decisões terem fun- damentos normativos, ora heterónomos ora autónomos relativamente à função jurisdicional, não têm força normativa – não aprovam, decretam ou criam quaisquer normas, quaisquer critérios de conduta vinculativos no futuro. VII – Não incidindo o presente recurso sobre um objeto normativo adequado a essa compreensão funcional da justiça constitucional, não pode o mesmo ser conhecido. Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional: I– Relatório 1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Central Administrativo do Norte, em que é recorrente A. e recorrido o Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, IP, foi interposto recurso do acórdão daquele tribunal, de 20 de novembro de 2014, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b) , da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»).

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