TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
463 acórdão n.º 691/16 na medida em que é o obrigado solidário que passa a responder pelo cumprimento integral da sanção que respeita a uma outra pessoa jurídica, implicando a violação do princípio da pessoalidade das penas consignado no artigo 30.º, n.º 3, da Constituição.» Embora tecidas no contexto específico do direito penal (constitucional) e, mais concretamente, no con- texto da multa como reação criminal, esta compreensão é analogicamente aplicável em direito contraordena- cional. Isto a entender-se, como temos por seguro, que o n.º 3 do artigo 30.º da Constituição da República Portuguesa configura um imperativo vigente no domínio contraordenacional. 4. Note-se, por outra via, que nos termos da posição que fez vencimento, a teleologia da norma é associada à prevenção da “possibilidade de estas [pessoas coletivas] virem a ser colocadas numa situação de insuficiência patrimonial que inviabilize por motu proprio a satisfação do crédito”. O que, em meu entender, só agrava os problemas de inconstitucionalidade da norma em sindicância, agora também por preterição do Princípio da proporcionalidade. Tal sucede, desde logo, porque o ordenamento jurídico conhece já instrumentos próprios e idóneos a alcançar tal desiderato. Como ocorre, mormente com os artigos 78.º e 79.º no Código das Sociedades Comerciais. A fazer avultar a desnecessidade da solução legal, claramente mais gravosa, prevista no n.º 3 do artigo 551.º do Código do Trabalho, a ditar uma automaticidade na responsabilização solidária dos admi- nistradores, gerentes ou diretores. Acresce que nem sequer se mostra correto que aquela mesma norma se dirija ao prosseguimento dos fins postos em relevo. Na verdade, o n.º 3 do artigo 551.º do Código do Trabalho prescreve que o administrador, gerente ou diretor seja responsabilizado solidariamente pelo pagamento da coima sempre que se constate a prática de infração laboral pela correspondente pessoa coletiva. Não se exige, assim, que ocorra uma diminui- ção culposa do património social que inviabilize o pagamento da coima ou um comportamento preordenado à frustração de tal liquidação por parte da pessoa coletiva. A norma em apreço prescinde, pois, de qualquer facto próprio do responsabilizado: seja em matéria de contribuição para a ocorrência do ilícito contraorde- nacional; seja em matéria de criação ou potenciação do perigo da não satisfação do crédito correspondente à sanção. O que se afirma com tanto mais rigor quando a dimensão normativa em sindicância dispensa a formulação de um qualquer juízo de culpa. Temos, assim, que a pessoa coletiva poderá achar-se perfeitamente capacitada para o pagamento da coima, subsistindo ainda assim, uma paralela exigência de pagamento ao administrador, gerente ou diretor. Mas se assim é, o que verdadeiramente se prescreve na norma em questão reconduz-se a uma responsabi- lidade funcional, que se basta com o exercício da atividade de administração do ente coletivo. Ou seja, o administrador, gerente ou diretor é responsabilizado simplesmente porque o é. O que ocorre, aliás, com a agravante pertinentemente sinalizada no voto de vencido formulado pelo Conselheiro Pedro Machete no Acórdão n.º 395/14. É que o responsável solidário ficará pessoalmente res- ponsável por uma coima necessariamente mais gravosa do que ocorreria caso fosse pessoalmente responsável pela infração. Na verdade, não só as molduras contraordenacionais mobilizáveis em face das pessoas coletivas se apresentam invariavelmente mais elevadas nos respetivos limites, como os fatores de medida da coima serão necessariamente ponderados em face de realidades díspares. É por isso que não posso acompanhar o entendimento de que a dimensão normativa em sindicância e que se extrai do n.º 3 do artigo 551.º do Código do Trabalho satisfaz as exigências que a Constituição da República impõe. – Manuel da Costa Andrade. Anotação: 1 – Os Acórdãos n. os 336/08 e 395/14 estão publicados em Acórdãos , 72.º e 90.º Vols., respetivamente. 2 – Os Acórdãos n. os 180/14, 201/14 e 395/14 estão publicados em Acórdãos , 89.º Vol.
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