TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

459 acórdão n.º 691/16 pessoas coletivas (João Soares Ribeiro, Análise do Novo Regime Geral das Contraordenações Laborais, Questões Labo- rais, Ano VII, 2000, p. 20). Poderá dizer-se que a razão de ser do regime legal decorre da necessidade de acautelar o pagamento das coimas aplicáveis às pessoas coletivas, prevenindo a possibilidade de estas virem a ser colocadas numa situação de insufi- ciência patrimonial que inviabilize por motu proprio a satisfação do crédito. O recurso a um princípio civilístico de solidariedade passiva, para esse efeito – que nunca poderia justificar a transferência de uma responsabilidade penal –, não deixa de ser uma medida compreensível no plano de política legislativa e numa perspetiva utilitarista de eficácia da prevenção contraordenacional. Funciona aqui uma garantia patrimonial que é exigível ao administrador ou gerente em função da sua qualidade de representante legal da pessoa coletiva e em atenção à sua ligação física e funcional à atividade empresarial que é suscetível de envolver a prática de infrações contraordenacionais (neste sentido, João Soares Ribeiro, Contraordenações Laborais. Regime Jurídico Anotado, 3.ª edição, Coimbra, pp. 335-336). De facto, a autonomia do ilícito de mera ordenação social em relação ao direito penal reflete-se também na natureza da coima, que é uma sanção exclusivamente patrimonial e que se diferencia, na sua essência e nas suas finalidades, da pena criminal, e que se não liga à personalidade do agente, o que também explica que não sejam, no caso, invocáveis, como parâmetros de constitucionalidade, os princípios da culpa e da proporcionalidade da sanção. Por idêntica ordem de considerações, não tem cabimento a invocação da violação do princípio da igualdade. Não se trata aqui de definir a moldura da coima aplicável a um administrador ou gerente com base em ele- mentos de aferição que apenas respeitem à pessoa coletiva e que são necessariamente diferenciados. O que está em causa é uma responsabilidade solidária que confere ao sujeito individual a condição de garante do pagamento da coima, a qual não deixa de ser fixada, no âmbito do processo contraordenacional, em função da moldura ajustável à personalidade coletiva do devedor primário. Não ocorre, por isso, uma parificação, quanto ao objeto, de situações de responsabilidade que, do ponto de vista da natureza do sujeito responsável, sejam desiguais, e pudesse suscitar uma desconformidade com o princípio da igualdade». Portanto, estando em causa apenas a solidariedade pelo pagamento, enquanto garantia da satisfação da obrigação pecuniária, e não a responsabilidade pela infração, não há violação da regra constitucional prevista no artigo 30.º, n.º 3, da CRP, nem de qualquer dos princípios indicados pelo recorrente. 7.2.2. Ainda que o n.º 3 do artigo 551.º do CT fosse interpretado no sentido de consagrar uma trans- missão de responsabilidade contraordenacional, nem assim se se poderia concluir pela desproporcionalidade da medida, sobretudo num domínio em que é de reconhecer um maior poder de conformação do legislador, como se julgou no Acórdão n.º 201/14: «Ora, a norma  sub judicio , ao comprimir, é certo, o princípio da proibição de transmissão da responsabilidade, fá-lo em observância de deveres estaduais de proteção ou de prestação de normas, impendentes sobre o legislador ordinário, destinados a proteger bens jusfundamentais face a potenciais agressões provindas de terceiros, que se extraem do artigo 59.º, n.º 1, alínea  c) da Constituição. Com efeito, através da responsabilização dos respetivos administradores, dirigentes ou diretores pelo paga- mento de coima aplicada à pessoa coletiva responsável pela contraordenação laboral, o legislador terá pretendido tornar mais eficaz a efetivação do sistema sancionatório num domínio em que a Constituição lhe comete expres- samente deveres de proteção, ainda que sacrificando o princípio da proibição de transmissão da responsabilidade. Qualquer juízo sobre a razoabilidade da ponderação, efetuada pelo legislador ordinário, passa por pesar a inten- sidade do sacrifício imposto pela norma  sub judicio  ao princípio da proibição de transmissão da responsabilidade e a vantagem que através dela se obtém para efeitos da proteção dos deveres estaduais que se extraem do artigo 59.º, n.º 1, alínea c).

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