TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

406 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL esfera jurídica do sinistrado atingirá tutela de um certo direito absoluto que poderá ter acolhimento na Constituição. VII – Não deve perder-se de vista, em tal ponderação, a especial natureza da indemnização por acidente de trabalho, indissociável da perda efetiva funcional e física, temporária ou permanente, parcial ou absoluta, que visa reparar, não permitindo que o sacrifício dos credores se equacione isoladamente, desligado dessa natureza e da função da obrigação de indemnizar o sinistrado. VIII– No confronto entre o direito dos credores à satisfação dos seus créditos através do património do deve- dor e o direito deste à efetiva reparação dos seus danos, há que concretamente ponderar cada uma das situações envolvidas, o que poderá resultar na proporcionada restrição do primeiro, por não se poder afirmar, certamente não com o sentido total e abstrato que subjaz à decisão recorrida, que deva, em qualquer caso, prevalecer sobre o segundo. IX – Como tal, a interpretação do artigo 78.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro, com o sentido da absoluta impenhorabilidade e impossibilidade de apreensão para a massa insolvente dos créditos de indemnizações atribuídas ao insolvente em virtude de acidente de trabalho, só por si e sem mais – ou seja, desligada das ponderações descritas nos pontos antecedentes –, não é inconstitucional. Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – A causa 1. Refere-se o presente recurso, interposto pelo Ministério Público nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), a uma decisão de recusa de aplicação do artigo 78.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro (Regime de Reparação de Acidentes de Trabalho e de Doenças Profis- sionais), ao estabelecer a impenhorabilidade dos créditos provenientes do direito à reparação por acidentes de trabalho. Foi esta decisão proferida no contexto processual que passamos a descrever. 1.1. Nuns autos de insolvência cujos termos correm na 2.ª Secção de Comércio (Vila Nova de Famali- cão) da Instância Central do Tribunal Judicial da Comarca de Braga com o n.º 6131/14.2T8VNF, nos quais é insolvente A., foi proferido pelo senhor Juiz titular do processo um despacho, datado de 12 de novembro de 2005 (está o mesmo certificado a fls. 25/26), pelo qual foi o Administrador da Insolvência autorizado a apreender um terço “[…] da quantia indemnizatória que vier a ser atribuída ao insolvente decorrente de acidente de trabalho”. Inconformado com tal decisão, dela recorreu o insolvente para o Tribunal da Relação de Guimarães, invocando a impenhorabilidade dessa indemnização, por referência ao artigo 78.º da Lei n.º 98/2009, e, consequentemente, a insuscetibilidade de apreensão de qualquer parte desta para a massa insolvente. 1.1.1. No Tribunal da Relação de Guimarães, foi proferido o acórdão certificado a fls. 46/53 negando provimento ao recurso. Da respetiva fundamentação consta o seguinte trecho (fls. 51/52):

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