TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
385 acórdão n.º 674/16 efeito suspensivo à prestação de caução e à existência de um prejuízo considerável) desincentiva impugnações movidas com intenção dilatória, num universo de destinatários que, tendencialmente, apresentam maior capacidade económica para absorver os custos de uma litigância à outrance . Não estando em causa o direito a impugnar judicialmente a decisão administrativa, a possibilidade de requerer a atribuição de efeito suspensivo quando a execução da decisão condenatória causar prejuízo con- siderável ao arguido, mediante prestação de caução (artigo 84.º, n.º 5, da Lei da Concorrência), não deixa de permitir dar resposta aos casos em que a execução imediata da sanção constitua um obstáculo relevante ao exercício do direito de impugnação, numa ponderação que nada tem de automático, ao contrário do que se afirma no presente Acórdão, desde logo com algum descaso da circunstância de a arguida se ter oferecido para prestar caução. A este propósito, importa, também, sublinhar que a prestação de caução se pode realizar por modos muito diversos – v. g. , através da prestação de garantias, cfr. artigo 623.º, n. os 1 e 3, do Código Civil –, que não implicam a disponibilização imediata de todo o valor da coima, o que não deixa de abrir caminho à ponderação das especiais circunstâncias de um arguido assimiláveis a relevantes constrangimen- tos financeiros. Aliás, a sua condição económica já releva na fixação do valor da coima. Não parece correto, assim, afirmar que o sistema “[…] não acautela a possibilidade de verificação de insuficiência económica do arguido/recorrente”, ou que implica “[…] um ónus de efeitos equivalentes ao cumprimento da coima”. A Constituição não impõe, em geral, a regra do efeito suspensivo (este não resulta do artigo 32.º, n.º 10, desde logo) e a regra em causa, considerando o funcionamento do mecanismo da prestação de caução – mais ainda no domínio empresarial –, não se traduz na imposição de um obstáculo desmesurado ao impugnante, pelo que não se perspetiva, por aí, uma restrição intolerável ao exercício do direito de defesa do destinatário da sanção. Ademais, no âmbito das contraordenações, o princípio da presunção de inocência não deixa de apresentar especificidades, não exigindo a consagração universal do efeito suspensivo da impugnação. Independentemente de qual seja a melhor solução – questão que extravasa por completo da competên- cia deste Tribunal –, afigura-se que a atribuição de efeito meramente devolutivo (nas apontadas condições, incluindo a possibilidade de prestação de caução em casos justificados) se inscreve, ainda, dentro da margem de liberdade do legislador na modelação do regime processual da impugnação. Sacrificando o regime, no que a essa regra diz respeito, fica prejudicada a eficácia potencial do sistema sancionatório no domínio da concorrência – e, nessa medida, a realização dos interesses que tutela –, sem que, do lado do impugnante – da generalidade dos impugnantes destinatários deste regime sancionatório –, se salvaguarde uma posição especialmente carecida de tutela, perante a margem de apreciação que a norma, apesar de tudo, ainda per- mite. – J. A. Teles Pereira. Anotação: 1 – Os Acórdãos n. os 269/87, 345/87 e 412/87 estão publicados em Acórdãos , 10.º Vol. 2 – Os Acórdãos n. os 30/88, 158/92 e 473/94 estão publicados em Acórdãos , 11.º, 21.º e 28.º Vols., respetivamente. 3 – Os Acórdãos n. os 469/97, 50/99 e 278/99 estão publicados em Acórdãos , 28.º, 42.º e 43.º Vols., respetivamente. 4 – Os Acórdãos n. os 33/02, 659/06 e 45/08 estão publicados em Acórdãos , 52.º, 66.º e 71.º Vols., respetivamente. 5 – Os Acórdãos n. os 135/09, 595/12, 299/13 e 373/15 estão publicados em Acórdãos , 74.º, 85.º, 87.º e 93.º Vols, respeti- vamente. 6 – Os Acórdãos n. os 297/16 e 376/16 estão publicados em Acórdãos , 96.º Vol. 7 – Ver, neste Volume , o Acórdão n.º 675/16.
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