TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

382 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL está na iminência de provocar prejuízo, grave e irreparável ou de difícil reparação para a concorrência, pode a Autoridade da Concorrência, em qualquer momento do processo, ordenar previamente a imediata suspen- são da prática restritiva ou quaisquer outras medidas provisórias necessárias à imediata reposição da concorrência ou indispensáveis ao efeito útil da decisão a proferir no termo do processo» (itálico nosso). Trata-se de um outro mecanismo alternativo ao previsto na norma em julgamento. Assim se vê que existem opções normativas menos lesivas do direito de acesso ao tribunal, que respei- tando a presunção de inocência do arguido, não representam perda de eficácia na prossecução do fim de interesse público prosseguido. Conclui-se, assim, que a solução normativa em apreciação viola a dimensão da necessidade inerente ao princípio da proporcionalidade. 22. Mesmo que se tivesse concluído de outro modo no que respeita ao teste da necessidade, ainda assim a norma mereceria censura constitucional por violar o teste da justa medida. O princípio da proporcionalidade em sentido estrito veda a adoção de medidas que se apresentem como excessivas (desproporcionadas) para atingir os fins visados. É o caso da solução normativa sob juízo. Na verdade, ao traduzir a imposição de um ónus de efeitos equivalentes ao cumprimento da coima para evitar a antecipação daquele mesmo cumprimento a norma recusada afronta o princípio da proporcionali- dade, por se apresentar como medida excessiva diante dos fins prosseguidos. Ainda que, de acordo com a jurisprudência constitucional, seja de aceitar uma maior amplitude do poder de conformação do legislador democrático quando versa sobre o direito contraordenacional por com- paração com a margem de discricionariedade deixada ao legislador penal, designadamente em sede de defi- nição das garantias de defesa do arguido (cfr. por todos Acórdão n.º 297/16, ponto 14), a norma em análise, onerando excessivamente o direito de acesso a uma tutela judicial efetiva, praticamente esvazia de sentido a presunção de inocência atribuída ao arguido, o que constitui compressão excessiva das garantias de defesa previstas no artigo 32.º, n. os 2 e 10, em articulação com o artigo 18.º, n.º 2, da Constituição. E esta conclusão não é infirmada pela circunstância de a caução poder vir a ser devolvida por efeito da decisão final, pois que a desproporção na medida ali prevista não sofre qualquer alteração na sua essenciali- dade por força desta possível reparação. 23. Por último – cumpre notar ainda – a norma recusada não acautela a possibilidade de verificação de insuficiência económica do arguido/recorrente. Numa análise de ponderação custos-benefícios, esta desconsi- deração total da situação económica do visado onera desproporcionadamente o sacrifício infligido no direito fundamental do acesso à justiça individual para atingir o benefício de interesse público prosseguido. Impondo a prestação de uma garantia de valor equivalente ao montante da coima mesmo aos arguidos que não tenham meios para a prestar, a solução normativa em causa exacerba o potencial inibidor da opção pela via de recurso de forma intolerável, já que redunda numa solução que esvazia uma das dimensões essenciais do direito de acesso à via judicial de plena jurisdição. Na prática, propicia-se a imediata execução da coima por falta de meios económicos do visado para impugnar a decisão da AdC de forma apta a prevenir o seu imediato pagamento. 24. Diante de uma norma que condicionava o seguimento dos recursos judiciais contra a aplicação de uma coima ao prévio depósito do quantitativo da coima – a norma constante do n.º 5 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 21/85 – o Tribunal Constitucional concluiu pela inconstitucionalidade quando referida a recorrentes com insuficiência de meios económicos (vide Acórdãos n. os 269/87, 345/87 e 412/87, culmi- nando no julgamento com força obrigatória geral proferido no Acórdão n.º 30/88) No primeiro dos referidos Acórdãos pode ler-se: “Esta possibilidade de se recorrer para os tribunais, onde se poderá realizar uma audiência de julgamento, retira a razão a Cavaleiro Ferreira quando sustenta que é inconstitucional o julgamento pela Administração das contraor- denações (cfr. Lições de Direito Penal, I, 1985, p. 32).

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