TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016
381 acórdão n.º 674/16 direito ao recurso ou à impugnação, levando o arguido administrativamente condenado a ter medo de se prejudicar com o recurso ou impugnação e criando-lhe, assim, uma forte inibição que o levará a evitar os recursos» (“A reformatio in pejus no processo de contraordenações”, in Estudos dedicados ao Professor Doutor Nuno José Espinosa Gomes da Silva, vol. 1, Universidade Católica Editora, pp. 421-452, p. 437). Foi precisamente por se considerar que se perdia uma forte razão para desmotivar a instauração de recursos infundados que a regra da proibição da reformatio in pejus , introduzida no Regime Geral das Contraordenações pela reforma de 1995, sofreu abundantes críticas da doutrina da especialidade (cfr. Germano Marques da Silva, Direito Penal Português, Parte Geral, vol I, 1997, p. 141). Nas palavras de Paulo Pinto de Albuquerque, «A proi- bição da reformatio in pejus é inconveniente, injustificável e tem efeitos perversos, tais como aumenta o número de recursos independentemente da gravidade das sanções e torna os recursos economicamente compensadores, sempre que estejam em causa sanções muito elevadas, por via do deferimento no tempo do respetivo paga- mento» ( Comentário do Regime Geral das Contraordenações à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, UCP, 2011, pp. 294-295; cfr. também, “A Reforma do Direito das Contraor- denações”, in Estudos de Homenagem ao Prof. Doutor Jorge Miranda, Vol IV, p. 750). Igualmente críticos da introdução da reformatio in pejus no Regime Geral das Contraordenações, vide Carlos AdéritoTeixeira, “Direito de mera ordenação social: o ambiente como espaço da sua afirmação”, in Revista do Ministério Público, ano 22, n. 85, 2001, p. 89; Taipa de Carvalho, Direito Penal, Parte Geral, Questões fundamentais , UCP, 2003, p. 174, Leones Dantas, “O Ministério Público no processo de contraordenações”, in Revista de Questões Laborais , ano VIII (2001), n.º 17, p. 38. Existem, portanto, alternativas menos gravosas para o direito do arguido de acesso ao tribunal que prosseguem a mesma solução dissuasiva do abuso dos recursos. Foi inclusivamente equacionado nos trabalhos preparatórios do novo Regime Jurídico da Concorrência conjugar o efeito suspensivo do recurso com a previsão da correção monetária do montante da coima fixado a final (Miguel Gorjão Henriques, Lei da Concorrência, Comentário Conimbricence, Almeida 2013, p. 818). 21. Por outro lado, o condicionamento do efeito suspensivo do recurso à efetiva prestação de caução no prazo fixado pelo tribunal – cfr. artigo 84.º, n.º 3 – inculca uma ideia de automatismo que, pode não deixar espaço para um juízo de dispensa ou adequação (designadamente do montante e modo de prestação) atentos os circunstancialismos do caso concreto. Como já foi afirmado “(…) a redação da lei não parece deixar margem de manobra para que o juiz dispense a prestação de caução, uma vez que exige que a mesma seja efetiva” (Teresa de Lima Mayer Alves Moreira, A Desnecessidade da Exequibilidade Imediata da Coima no Novo Regime Jurídico da Concorrência à Luz do Princípio da Presunção de Inocência e do Direito de Acesso aos Tribunais , inédito, p. 42). De acordo com a dimensão normativa dos n. os 4 e 5 do artigo 84.º da LdC, cuja aplicação foi recusada, por inconstitucionalidade, pelo tribunal a quo, a atribuição do efeito suspensivo depende da prestação de uma caução cuja fixação não é atribuída a apreciação judicial. A prestação da caução a que alude a parte final do n.º 5, do artigo 84.º representa uma condição ope legis , desde que se encontre demonstrado o prejuízo consi- derável resultante da execução da coima. O juiz é chamado a verificar se a execução da coima causa o prejuízo considerável ao recorrente por este invocado no requerimento de interposição do recurso, mas, demonstrado este prejuízo, a decisão judicial restringe-se à fixação de um prazo para a prestação de caução, “em substituição” do montante da coima, o que inculca a ideia de necessária correspondência entre os dois montantes. Ora, uma tal automaticidade não consente a devida ponderação circunstanciada do caso, designada- mente para efeitos de avaliação da exigibilidade da prestação de uma caução de montante igual ao da coima para prevenção de eventuais perigos que se imponha acautelar e que podem encontrar mecanismo alternativo nas medidas provisórias. É, todavia, possível configurar uma solução legislativa alternativa em que a presta- ção de caução não esteja ligada ao referido automatismo, permitindo a ponderação pelo juiz do seu valor. Acrescente-se, aliás, que o processo contraordenacional não exclui a possibilidade de aplicação de algu- mas medidas cautelares que visam assegurar os fins do processo. No caso da LdC, o artigo 34.º dispõe expressamente que «sempre que as investigações realizadas indiciem que a prática que é objeto do processo
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