TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 97.º Volume \ 2016

380 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL e Financeira, tendo por base um Memorando de Entendimento sobre as condicionalidades de Política Econó- mica celebrado com a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional. Nesse documento, Portugal comprometeu-se a «adotar medidas para melhorar a celeridade e a eficácia da aplicação das regras da concorrência» (ponto 7.20.), «estabelecer um tribunal especializado no contexto das reformas do sistema judicial» (ponto 7.20. v.) e a «propor uma revisão da Lei da Concorrência, tornando-a o mais autónoma possível do Direito Administrativo e do Código de Processo Penal e mais harmonizada com o enquadramento legal da concorrência da UE» (ponto 7.20. vi.), em particular, «avaliar o processo de recurso e ajustá-lo onde necessário para aumentar a equidade e a eficiência em termos das regras vigentes e da adequação dos procedimentos» (ponto 7.20. vi., 3.º travessão) [documento disponível em português in http://www.portugal.gov.pt/media/371372/mou_pt_20110517.pdf ] . A Exposição de Motivos da Proposta de Lei 45/XII, no que para agora nos interessa, refere igualmente o objetivo de «simplificar a lei e introduzir maior autonomia das regras sobre a aplicação de procedimentos de concorrência relativamente às regras de procedimentos penais e administrativos» e procurar «aumentar a equidade, a celeridade e a eficiência dos procedimentos de recurso judicial de decisões da Autoridade da Concorrência». É este o contexto legislativo da nova LdC, onde a norma impugnada se insere, que pretendeu fazer con- vergir o regime nacional da concorrência com o Direito da União Europeia e prosseguir o fim de imprimir maior celeridade e eficácia na aplicação das regras da concorrência, conferindo, para o efeito, maior efetivi- dade aos poderes sancionatórios. O fim da norma objeto do processo, impondo como regra geral o efeito meramente devolutivo do recurso, condicionando o efeito suspensivo à prestação de caução e à verificação de prejuízo considerável, é a diminuição dos recursos judiciais infundados e cujo objetivo seja meramente dilatório, isto é, adiar o pagamento da coima. Manifesto é, assim, o propósito desincentivador do recurso veiculado pela nova regulamentação. Identificado o fim prosseguido pela solução normativa em juízo, vejamos, então, se ela se acomoda às três dimensões identificadas no princípio da proporcionalidade. 19. O subprincípio da idoneidade determina que as medidas restritivas de direitos, liberdades e garan- tias devem constituir um meio idóneo para a prossecução dos fins visados tendo em vista a salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos. Tomando o propósito expressamente enunciado pelo legislador ao reformular o regime da concorrência (cfr. Exposição de Motivos da Proposta de Lei 45/ XII), no contexto do Memorando de Entendimento, ambos já referidos no ponto anterior (nomeadamente de separar «as regras sobre a aplicação de procedimentos de concorrência das regras de procedimentos penais, no sentido de assegurar a aplicação efetiva da Lei da concorrência» e «aumentar a equidade e a eficiência em termos das regras vigentes e da adequação dos procedimentos»), a solução normativa em análise não ofe- rece nenhum problema de desadequação. Não se duvida que a sujeição da suspensão da execução da coima visada pela impugnação ao pagamento de um montante equivalente demoverá os propósitos infundados e meramente dilatórios, contribuindo, desde modo, para o desincentivo do recurso à impugnação judicial infundada da decisão proferida pela AdC. Se o efeito útil visado pela impugnação é não pagar, ou adiar o pagamento, da coima, impor o respetivo pagamento integral para suspender a execução da decisão, neutraliza o objetivo pretendido. 20. Diferente se apresenta, porém, a resposta a dar à pergunta sobre se a norma objeto de fiscalização se apresenta como necessária ao prosseguimento dos objetivos delineados para satisfazer o interesse público. De acordo com a dimensão da necessidade/exigibilidade do princípio da proporcionalidade, as medidas restritivas de direitos fundamentais têm de ser indispensáveis para alcançar os fins em vista, não sendo con- figuráveis outros meios menos restritivos para alcançar o mesmo fim. Ora, no caso, existem outras medidas que servem eficazmente de desincentivo ao recurso à impugnação judicial manifestamente infundada: desde logo, a já consagrada reformatio in pejus (artigo 88.º, n.º 1, da LdC). Como salientado por José Lobo Moutinho, é «patente que essa admissão condiciona o exercício do

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